GT REFORMA UNIVERSITÁRIA

Blog do Grupo de Trabalho sobre Reforma Universitária constituído por estudantes da Universidade Federal da Bahia.

domingo, maio 13, 2007

REFORMA UNIVERSITÁRIA:
ANÁLISE DO GRUPO DE TRABALHO COMPOSTO POR ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA



01 - INTRODUÇÃO


O Grupo de Trabalho da Reforma Universitária iniciou suas atividades logo após a deflagração da greve pelos estudantes da Universidade Federal da Bahia, em julho de 2004. Inicialmente composto por estudantes do curso de Administração, o grupo conta atualmente com a participação de estudantes dos mais diversos cursos, de diferentes áreas do conhecimento.
Durante todos esses meses, estudamos e debatemos em grupo, além de participarmos de debates e exposições, procurando obter um conhecimento cada vez mais sólido, até alcançarmos o nosso objetivo final – a construção de uma análise da Reforma Universitária em curso, e a proposição de diretrizes para o ensino superior brasileiro.
Em maio de 2005 o GT Reforma divulgou a primeira análise da reforma, que foi disponibilizada em versão impressa e em meio eletrônico. Participamos de diversos encontros e debates em Salvador e em outras cidades brasileiras.
Procuramos inicialmente fazer uma breve explanação sobre o contexto no qual a Reforma Universitária está inserida, enfatizando a lógica neoliberal de adaptação à crise do modo de produção capitalista e a Reforma do Estado proposta no Governo Fernando Henrique Cardoso, que introduziu no Brasil o conceito da administração pública gerencial.
Em seguida, apresentamos uma análise crítica da proposta do Governo Lula, que constará dos diversos projetos apresentados no contexto da Reforma. A análise abordará as seguintes temáticas: o discurso do MEC em favor da Reforma universitária; a lei que institui as Parcerias Público Privadas; o Programa Universidade Para Todos; a Lei de Incentivo à Inovação Científica e Tecnológica; a Proposta de Emenda Constitucional nº 217; o Sistema Nacional de Avaliação Superior (SINAES) e a Lei Orgânica do Ensino Superior – Terceira Versão do Anteprojeto da Reforma Universitária.
Após esta análise, elaboramos uma breve explanação sobre a Proposta de Reforma da Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior e sobre o Plano Nacional de Educação elaborado pela sociedade civil – que representaram, em muitos momentos, forte embasamento na elaboração da nossa proposta.
Por fim, apresentamos uma análise e propomos algumas diretrizes para o financiamento da educação superior brasileira; o tripé da formação superior: ensino, pesquisa e extensão; acesso e permanência na educação superior brasileira e a autonomia universitária.




02 – CONTEXTUALIZAÇÃO


Apresentaremos a seguir o contexto no qual está inserida a Reforma Universitária – a lógica neoliberal de adaptação à crise do modo de produção capitalista, que prevê o Estado mínimo, ou seja, a desresponsabilização do Estado por setores de fundamental importância para a sociedade.





02.1 - Reforma do Estado – Um Projeto Neoliberal de Ajuste a Crise do Modo de Produção Capitalista

A Reforma Universitária, apresentada pelo Governo Lula, segue a mesma lógica da Reforma do Estado proposta, em 1995, no Governo Fernando Henrique Cardoso, e que tem como principal expoente nacional Luiz Carlos Bresser Pereira – Ministro da Administração Federal e Reforma do Estado no citado Governo.
A Reforma do Estado defendida por Bresser Pereira possui um viés economicista e neoliberal, e parte do pressuposto de que a grande crise que atingiu o Brasil mais fortemente a partir da década de 80 é uma crise de Estado.
O modelo de crescimento Keynesiano gerou uma estabilidade econômica durante as três décadas que sucederam a segunda Guerra Mundial. Na década de 70, este modelo enfrentou sua crise, que se manifestou principalmente na forma de uma inflação desenfreada, e levou a uma estagnação dos níveis de renda global. Contribuíram para este quadro também a crise do petróleo, do câmbio dólar/ouro e do modelo fordista de produção – esta última na década de 60.
Em resposta a crise, o modo de produção capitalista passou por uma reestruturação que pode ser evidenciada pelo esforço empreendido na desregulamentação, privatizações e no desmantelamento do contrato social entre trabalho e capital, que, segundo Castells (1999) tinham como principais objetivos: aprofundar a lógica do lucro nas relações capital/trabalho; aumentar a produtividade; globalizar a produção; e direcionar apoio estatal para ganhos de produtividade em detrimento da proteção social e de normas de interesse público.
A crise que abalou a economia mundial, definida por Bresser Pereira e por tantos outros como uma crise de Estado, tem suas origens na crise do modelo produção capitalista via fordismo, ocorrida na década de 60. Ou seja, em características intrínsecas do mecanismo de Mercado e não de ineficiência do Estado. A partir desta crise as empresas começaram a se flexibilizar e utilizarem os recursos de maneira mais eficiente, agregaram as tecnologias da informação, e desenvolveram mecanismos gerenciais mais complexos, pois os mercados estavam segmentados e disputados.
O que a proposta de Reforma defendida pelo MARE (Ministério da Administração Federal de Reforma do Estado) pretende é fazer com que o Estado atue de forma semelhante às empresas – adotando os princípios da administração pública gerencial. Ao invés de se questionar por que a renda global parou, defende que o Estado adote práticas empresariais que se comprovaram ineficientes como modelo de regulação da sociedade, deseja que o Estado se adapte a escassez de recursos e não questiona a estrutura que levou a esta escassez.
O Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado definiu as diretrizes para a Reforma da Administração Pública brasileira, introduzindo o conceito de administração pública gerencial, adotado nos governos neoliberais de Thatcher (na Inglaterra) e Reagan (nos EUA), no cenário político brasileiro.
Partindo do pressuposto da existência de uma crise do Estado, o plano propôs mudanças na forma de propriedade e/ou nos modelos administrativos para cada uma das áreas de atuação do Estado, as quais dividiu em:
1 – Núcleo Estratégico - neste núcleo estão os Três Poderes e a cúpula dos Ministérios. Para este núcleo, Bresser Pereira propõe um modelo de propriedade exclusivamente estatal e uma administração predominantemente burocrática.
2 – Atividades Exclusivas - neste núcleo estão as atividades de regulamentação, fiscalização, fomento, segurança pública e seguridade social básica. É um setor no qual são prestados serviços que só o Estado pode realizar. Para este Bresser Pereira propõe um modelo de propriedade estatal e uma administração gerencial, pois, segundo ele, neste núcleo a eficiência é fundamental, e portanto este deve ser administrado com práticas semelhantes às adotadas nas empresas.
3 –Serviços Não Exclusivos – neste setor estão as atividades exercidas pelas universidades, hospitais, centros de pesquisa e museus. O Plano propõe para estas atividades uma administração gerencial e um tipo de propriedade pública não-estatal. Prevê que o Estado atue conjuntamente com outras organizações públicas não-estatais e privadas. Para este setor o Plano propõe um programa de “publicização”, transformando as instituições que exercem as atividades deste setor em “organizações sociais” – entidade de direito privado, sem fins lucrativos, que detém autoridade específica do Poder Legislativo para celebrar contrato de gestão com o Executivo, e assim ter direito a dotação orçamentária.
4 – Produção para o Mercado – neste setor estão as empresas estatais, e a regra é a privatização.
A Reforma proposta pelo MARE prevê uma redução da participação do Estado, no que se convenciona chamar atividades não-exclusivas - como educação, saúde e pesquisa científica, transferindo à sociedade e principalmente ao mercado a responsabilidade por tais atividades. Ao transferir as atividades não-exclusivas para setores da sociedade civil organizada ou para o capital privado, e propor a privatização sob o controle de agências reguladoras, superestima a capacidade da sociedade civil brasileira de fiscalizar estas atividades, propondo algo que não condiz com a realidade sócio-cultural brasileira. Ou seja, importa teorias adotadas nos países centrais, ao invés de criar uma proposta condizente com a nossa realidade.
Segundo Marilena Chauí (2003), ao colocar a educação como um serviço não-exclusivo do Estado, a proposta defendida por Bresser Pereira prevê que esta deixe de ser considerada um direito do cidadão, tornando-se um serviço que pode ser privatizado. Ainda segundo a professora “a Reforma do Estado definiu a Universidade como uma organização social e não como uma instituição social”. A Universidade é uma instituição social, e como tal “exprime a estrutura e o modo de funcionamento da sociedade como um todo”. Tratá-la como uma organização social significa reduzi-la a uma prática social determinada pela instrumentalidade, desconsiderando que a Universidade é uma instituição, e que a sua eficácia não depende apenas de sua particularidade, como é o caso de uma organização.
A proposta de Reforma Universitária apresentada pelo Governo Lula, segue o mesmo viés adotado nos governos anteriores. Prevê que a educação, que é um direito fundamental do cidadão, deve ser considerada como um serviço público não estatal. Deste modo, reduz a responsabilidade do Estado por este setor, transferindo-a para a iniciativa privada, ficando reservadas ao Estado, principalmente no âmbito do ensino superior, as atividades de supervisão e regulação.
A Reforma foi apresentada de forma “fatiada”, com vários projetos isolados, todos convergindo para a mesma lógica neoliberal de desresponsabilização do Estado e transferência de recursos públicos para o setor privado. Esta lógica segue as imposições do FMI que força a redução dos desequilíbrios fiscais através da diminuição das despesas sociais, mercantilizando as políticas públicas e privatizando o patrimônio público de propriedade do povo brasileiro.

02.2 – Governo Lula: desmistificando suas práticas e apresentando seu caráter neoliberal

Antes de aprofundarmos o debate sobre Reforma Universitária, é essencial a definição exata do caráter extremamente neoliberal do governo Lula. Sem esta base consolidada muitos debates dentro do movimento estudantil se perdem em defesas de correntes político-partidárias baseadas em discursos sem elementos reais de sustentação, dispersando a base e fragmentando a luta.
Uma das maneiras mais eficientes para compreender o nível de neoliberalismo de um determinado governo, é analisando o uso dos recursos públicos, em especial o quanto foi investido no país e o quanto foi destinado à remuneração do capital financeiro, a elite da burguesia. Sendo assim, quanto mais dinheiro for destinado à manutenção da dívida externa e ao pagamento de juros, menores serão os recursos disponíveis para investir no país. Para este trabalho, por razões óbvias, comparamos com os dados de investimento geral e investimento em educação em particular.
É necessário esclarecer três pontos relativos a metodologia adotada:

1) Em primeiro lugar, buscamos nos ater a fontes de pesquisa que dificilmente podem ser contestadas, sendo assim, a maioria dos dados vem do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão, Secretaria do Tesouro Nacional e documentos emitidos pelo próprio PT em diversas situações. Em cada gráfico será citada a respectiva fonte.

2) Um segundo esclarecimento metodológico, é o tempo-base. Os dados abrangem o período de 2000 a 2005. A proposta é comparar o mandato de FHC com o de Lula, uma vez que reconhecidamente o governo FHC ficou conhecido como neoliberal e conservador, sendo amplamente combatido por setores do PT que hoje estão no governo aplicando a mesma política. Os dados confirmam isto. Que fique claro que isto não é uma defesa do governo FHC, tanto o governo anterior como o atual servem as elites financeiras em detrimento a um projeto autônomo de nação.

3) Após cada tabela segue a fonte consultada, metodologia de elaboração e análise. Todas as tabelas originalmente consultadas se encontram disponíveis nos respectivos sites institucionais, e também no porta-arquivo do grupo que está aberto para qualquer um que queira se inscrever.


Ano 2000
R$ 19.453.492.110,03
Ano 2001
R$ 19.321.449.052,17
Ano 2002
R$ 19.341.055.317,86
Ano 2003
R$ 16.944.933.801,19
Ano 2004
R$ 15.825.322.831,93
Ano 2005
R$ 16.634.690.551,38

FONTE: Secretaria do Tesouro Nacional (http://www.stn.fazenda.gov.br)

METODOLOGIA: Tabulação dos dados em tabela que consta a despesa da União por função, selecionando a linha que apresenta o valor total em educação.

ANÁLISE: Esta tabela demonstra o investimento total do governo federal em educação, abrangendo três anos de FHC e três anos de Lula. O valor numérico e o gráfico demonstram que o valor é praticamente o mesmo, com uma leve tendência de queda.


FONTE: Secretaria do Tesouro Nacional (http://www.stn.fazenda.gov.br)

METODOLOGIA: Tabulação dos dados em tabela que consta a despesa da União por grupo, selecionando a linha que apresenta Amortização da Dívida – Refinanciamento.

ANÁLISE: O refinanciamento da dívida externa significa o quanto o Governo irá pegar emprestado no mercado financeiro para adiar o pagamento da dívida, é o arrolamento da dívida. Comparando FHC e Lula percebemos uma variação no gráfico, onde houve um aumento em 2003, redução em 2004 e novo aumento em 2005. A média do refinanciamento (integração e dependência ao capital financeiro) dos três anos do governo Lula é superior a média dos últimos três anos de FHC. O governo argumenta que a dívida está ficando mais controlável, pois está mudando o perfil da dívida (começando a vencer em mais tempo). Isto efetivamente está ocorrendo, mas para um volume irrisório do valor que se deve, e basta um pequeno “nervosíssimo” dos mercados, seja por crise internacional ou pelo processo eleitoral que se avizinha no nosso país, que os mercados iniciam uma “chantagem” amplamente legitimada e apoiada financeiramente pela política econômica do atual governo.


DÍVIDA PÚBLICA x SUPERÁVIT PRIMÁRIO

FONTE: Fórum Brasileiro do Orçamento
http://www.forumfbo.org.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?tpl=home


METODOLOGIA: edição do arquivo original para apresentar apenas a tabela acima.

ANÁLISE: O gráfico apresenta o valor da dívida externa e o do superávit primário (quanto o governo economiza para pagar os juros da dívida) em porcentagem do PIB. Percebemos que o valor da dívida em relação ao PIB permanece praticamente o mesmo, com uma pequena redução, que não chega a ser significativa a ponto de favorecer uma mudança da política econômica ou do crescimento do país. É importante ressaltar que o valor do superávit primário vem aumentando em relação ao PIB e em relação aos anos do governo FHC. Ou seja, do total das riquezas produzidas na nação Lula transfere mais dinheiro para o capital financeiro do que os governos anteriores.



Custeio e Investimento do Executivo
Superávit Primário
Ano 2000
65,2
38,15
Ano 2001
75,2
43,65
Ano 2002
71,4
52,39
Ano 2003
57,7
66,17
Ano 2004
70,3
81,11
Ano 2005
71,5
93,5

FONTE: Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão / Banco Central do Brasil


METODOLOGIA: Tabulação dos dados de Custeio e Investimento do Governo Federal, Tabulação dos valores do superávit primário em bilhões. A partir da tabulação, construção de gráfico cruzando as duas informações.

ANÁLISE: Este gráfico é bastante significativo, pois demonstra que a tendência de aumento do superávit primário é uma constante, mas o custeio e o investimento do governo federal sofrem uma queda até 2003, neste ano sofre uma ligeira recuperação retornando ao nível médio dos anos anteriores. Em 2004 e 2005 este valor fica praticamente estagnado, mas continua o aumento brutal do superávit primário com Lula.


FONTE: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão

METODOLOGIA: a tabela consta na proposta de orçamento do governo para o ano de 2006

ANÁLISE: A proposta de orçamento de 2006 ainda não foi votado no Congresso até a publicação deste documento, mas demonstra claramente as intenções do Governo. E nesta tabela, ainda não consta o desvio realizado pela D.R.U. (Desvinculação das Receitas da União) nem as outras contingências realizadas para o pagamento de juros da dívida. Entre outras informações, a que queremos ressaltar e que tem uma seta indicando. O gasto em educação é apenas 2,63% dos gastos totais do governo e apenas 1,3% dos gastos com refinanciamento da dívida externa.

Estas cinco tabelas mostram os principais elementos que nos permitem comprovar que o governo Lula é neoliberal. Caracterizado o governo, vamos partir para a análise das políticas de ensino superior.


02.3 – Desmontando as principais notícias do MEC sobre o Ensino Superior

O discurso do MEC é tão falacioso, apoiado em estatísticas fora do contexto real, que a título introdutório apresentamos cinco grandes “argumentos” do MEC e em seguida desfazemos a propaganda inserindo os dados na situação real, adequando ao contexto. Os dados apresentados entre aspas foram retirados da Nota Pública divulgada pelo ANDES-SN.
1. EXPANSÃO COM AUMENTO DE VAGAS
A) “A estimativa de demanda de acesso ao ensino superior para 2009 (ano que o governo pretende ter criado 150 mil novas matrículas), conforme o INEP é aproximadamente de 8,17 milhões”. A meta anunciada (150 mil novas vagas) não chega nem sequer a 2% dessa demanda!Ou seja: quantitativamente a expansão é ridícula frente a demanda.
B) O número de vagas é pífio para atender a demanda, e é ridículo em comparação com o crescimento do setor privado incentivado ou financiado pelo setor público. Pra termos uma idéia, o aumento do PROUNI em 2 anos foi cerca de 100.000 vagas. Somando-se ao FIES, que em 2004 financiou 318.679 contratos (ver relatório FIES 2004, disponível no site do MEC), em 2004 temos 418.679 vagas no setor privado criados através das ações do poder público. Observe que não estamos considerando outros programas do governo para o setor privado... Em suma: daqui há 4 anos 150.000 vagas a mais no setor público, e hoje já temos 418.679 vagas financiadas/incentivadas no setor privado, com declarações do MEC que as vagas no setor privado irão aumentar (ver entrevista do Ministro disponível no site do MEC).
C) Para alcançar a meta de 150.000 vagas na expansão e interiorização, temos que considerar que parte significativa encontra-se no quesito de ensino a distância. Para o setor privado o MEC já autorizou cerca de 2900 novos cursos a distância em 2006, e para o setor público criou a Universidade Aberta do Brasil, que irá oferecer ensino a distância no setor público, com enfoque especial para as regiões onde não há universidade, ou seja, o interior.

2. NÚMERO DE INSTITUIÇÕES PÚBLICAS
"O número de instituições particulares não parou de crescer: entre 2002 e 2004, a taxa de crescimento das particulares foi de 25%, o dobro dos cerca de 12% da rede pública (FSP, 30/6/05)." Como nada indica que esta tendência irá mudar, o cenário futuro é do ensino público ter uma participação cada vez menor no total de vagas do ensino superior. Portanto, estas novas universidades quantitativamente representam uma expansão muito menor do que o setor privado.
3. AUMENTO DE VERBAS PARA O SETOR PÚBLICO
“Tomando como referência o período 95-05, podemos constatar que, em ordem de grandeza, o orçamento executado das IFES (valores corrigidos pelo IPCA) está congelado em torno de R$ 7 bilhões (ou foi decrescente, conforme IGP-DI), situação não alterada pelo governo Lula da Silva, que, nos três primeiros anos de governo, ainda reduziu em 20% o montante de verbas em relação a 2002 (valores corrigidos pelo IGP-DI)." Ou seja: os recursos que o MEC está disponibilizando não são suficientes para manter o que já existe, quanto mais para realizar o que está dizendo que vai fazer. Além disso, na prática o dinheiro está sendo reduzido, pois os custos das universidades estão aumentando, porque no mínimo, os preços estão subindo (água, energia, papel, etc...).
4. CONTRATAÇÃO DE PROFESSORES
"MEC anunciou a realização de concurso para contratação de professores, prevendo a reposição de 2200 vagas (para as instituições já existentes), de 1750 vagas para a expansão e 50 para a Universidade Aberta do Brasil. Em 2003 a ANDES identificou um décit de 8 mil professores aposentados, sendo necessário concurso imediatos para no mínimo 6 mil professores." Ou seja, mesmo sem considerar as aposentadorias em 2004 e 2005 (que foram muitas, principalmente devido a reforma da previdência), o número de vagas não dá pra suprir metade da carência atual, quanto mais realizar expansão com qualidade.
Em professores substitutos a rede federal tem cerca de 5800 professores, ou seja, as vagas do concurso não vão chegar a cobrir nem 30% das aposentadorias ou 40% dos substitutos.
5. INTERIORIZAÇÃO
A interiorização é uma intenção eleitoreira (já vimos que a quantidade de vagas gerada é mínima), pois permite uma propaganda que diz atender as demandas dos movimentos sociais. Além disso, tem um outro viés, no sentido de começar mercados onde a remuneração ainda não é atrativa para o capital, para depois transferir para burguesia. Isto não é novo dentro do capitalismo, tanto em países ricos quanto pobres, é comum a burguesia se articular para que o estado invista em determinado setor e quando ele se tornar lucrativo abrir para iniciativa privada.
Isto é apenas um aperitivo, nas próximas páginas desenvolvemos os vários temas propostas na introdução. Este documento é um convite ao leitor para se debruçar sobre as propostas que influem decisivamente no ensino do país e em toda a sociedade. Um convite à crítica ao conhecimento e a ação.


03 – ANÁLISE DA REFORMA DO ENSINO SUPERIOR PROPOSTA PELO GORVERNO LULA


A partir de agora faremos uma análise crítica que constará dos principais projetos apresentados no contexto da Reforma Universitária, que são:

· A Lei que institui as Parcerias Público Privadas – Lei 11.079/04, de 30 de dezembro de 2004
· O Programa Universidade Para Todos – Lei 11.096, de 13 de janeiro de 2005;
· A Lei de Incentivo à Inovação Científica e Tecnológica - Lei Nº 10.973, de 02 de dezembro de 2004;
· A Proposta de Emenda Constitucional nº 217, de 2003;
· O Sistema Nacional de Avaliação Superior (SINAES) - Lei Nº 10.861, de 14 de Abril de 2004;
· Lei Orgânica do Ensino Superior – Anteprojeto da Reforma Universitária apresentado em 28 de julho de 2005 (terceira versão).



03.1 - Parcerias Público-Privadas (Lei 11.079/04, de 30 de dezembro de 2004) – Uma Relação Promíscua entre o Público e o Privado

A Lei 11.079, de 30 de dezembro de 2004, que institui as parcerias público-privadas, está inserida na lógica de transferência das responsabilidades do setor público para o privado presente na Reforma do Estado idealizada por Bresser Pereira, e da qual fazem parte as Reformas da Previdência, Universitária e Trabalhista.
O principal argumento do governo para a aprovação da lei é que o Estado não tem recursos para os investimentos necessários, e as PPP’s seriam a “varinha de condão” que faria a iniciativa privada arcar com estes investimentos.
Em seu artigo 2°, a referida lei define parceria público-privada como “o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa”.Até então, o contrato administrativo por concessão era regido pela Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Basicamente, essa lei delegava à iniciativa privada responsabilidades do Estado, e, em contrapartida, as empresas poderiam cobrar tarifas dos usuários do respectivo serviço. Usuários estes que, aliás, já pagam por esses serviços através de impostos exorbitantes. É o caso, por exemplo, dos pedágios que pagamos às empresas privadas para usar estradas pelas quais também pagamos ao governo. Essa é a concessão comum, na qual o contribuinte paga duas vezes pelo mesmo serviço, e o Estado se desresponsabiliza de suas obrigações.
A grande novidade das parcerias público-privadas é a concessão patrocinada, que é muito parecida com a concessão comum, com o adicional de um pequeno detalhe: além de a empresa que construiu a estrada poder cobrar tarifas dos usuários, ela ainda vai receber uma contrapartida pecuniária do governo. Contrapartida esta, mais uma vez, paga pelo contribuinte, que, na realidade, estará pagando três vezes pelo mesmo serviço. Difícil de acreditar, mas o parágrafo 1° do artigo 2° da Lei 11.079 não deixa dúvidas: “Concessão patrocinada é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado”.
Mas o que fazer, se o governo não tem dinheiro? Aí entra mais um pequeno detalhe que caracteriza a aberração que é a relação entre o poder público e o privado no Brasil: o dinheiro para os investimentos virá do governo, que emprestará à iniciativa privada para que esta possa lucrar fazendo obras que o governo alega que não tem verbas para fazer. Isso ocorre porque praticamente todo o investimento privado realizado no Brasil é financiado pelo BNDES com dinheiro público. Aprovada, a lei permite que 70% do investimento privado seja financiado pelo próprio governo.
Na verdade, este limite pode ser extrapolado, desde que haja autorização do Poder Legislativo. Está lá, no parágrafo 3° do art 10: “As concessões patrocinadas em que mais de 70% (setenta por cento) da remuneração do parceiro privado for paga pela Administração Pública dependerão de autorização legislativa específica”. Essa porcentagem é acrescida de 10% nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e mais 10% quando as “contribuições de capital” forem realizadas por fundos de pensão, empresas públicas ou sociedades de economia mista controladas pela União. Nem sequer esses limites constavam do projeto de lei original enviado ao Congresso. Ainda assim, segundo o governador do Paraná, Roberto Requião (PMDB), nada garante que esses 30% não serão emprestados ao setor privado pelo próprio BNDES, o que significa que mesmo os recursos privados serão públicos. Segundo ele, as PPP’s são “um modelo de investimento com seguro de lucro a partir de recursos públicos, sob o comando privado”.
Mas quem disse que as empresas privadas arriscar-se-iam a entrar em negócio tão duvidoso? Não se pode oferecer quaisquer riscos a elas, e para oferecer-lhes toda a segurança possível, o governo lhes garante a precedência de pagamentos através do Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas (FGP), um fundo de natureza privada com simplesmente 6 bilhões de reais, entre recursos do Orçamento e ativos da União, de modo que o governo não possa utilizar o dinheiro para nenhum outro propósito que não as PPP’s. Está aí uma boa alternativa para se aplicar também à Saúde e à Educação, já que nem o percentual mínimo estabelecido pela Constituição para estas áreas é obedecido. Ao menor sinal de turbulência externa, as poucas verbas das áreas sociais são contingenciadas. Mas não se pode tocar nos 6 bilhões que têm que servir de garantia às grandes empreiteiras e aos fundos de previdência privada. Estados e Municípios deverão criar seus próprios fundos garantidores.
O professor de Direito Administrativo da UFF e da FGV Pedro C. Raposo Lopes, numa análise jurídica das PPP’s, aponta ainda outras falhas na Lei 11.079/04. Uma delas é quanto à modalidade de “concessão administrativa”, que “nada mais são que pura prestação de serviços à Administração Pública, não se instaurando, por intermédio delas, a relação jurídica triangular ínsita às concessões”.Tratando-se de uma simples prestação de serviços, deveria ser regida pela Lei 8666/93.
Uma inovação da Lei 11.079/04 é a criação do conceito da sociedade de propósito específico, “a pessoa jurídica que deverá ser constituída antes da celebração do contrato, incumbida de implantar e gerir o objeto da parceria”, o que acaba criando outra confusão: “o concessionário de serviço público (que é quem figurará no contrato de parceria) será pessoa diversa da executora do serviço (sociedade de propósito específico). Como a execução de serviço público por particulares só pode dar-se mediante permissão ou concessão, por força de ditame constitucional (art. 175), parece-nos que, na verdade, a real executora dos serviços concedidos será uma sociedade de mera participação do Estado (uma quase-estatal) que não celebrou contrato com a Administração Pública e que não participou do necessário prévio certame...” [1]
As principais condições que a Lei 10.079/04 estabelece para a realização dos contratos de parcerias público-privadas são: valor mínimo de 20 milhões de reais por projeto; período mínimo de 5 e máximo de 35 anos, incluindo eventual prorrogação; limite de gastos de 1% em relação à receita líquida da União, Estados e Municípios; e a vedação de celebração de contrato de parceria público-privada que tenha como objeto único o fornecimento de mão-de-obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública.
Foi também estabelecida a opção pela arbitragem para a resolução de conflitos. Por esse mecanismo, partes privadas em desacordo podem resolver disputas sem recorrer à Justiça, indicando especialistas para servirem como "juizes", o que não deixa de ser mais uma forma de desresponsabilização do Estado.
De tudo isso, a conclusão a que se pode chegar é que as parcerias público-privadas estabelecem uma relação promíscua entre o público e o privado, misturando-os e confundindo-os a tal ponto que aquele passa a ser totalmente subjugado por este. Um sistema no qual o Estado empresta dinheiro à iniciativa privada para esta prestar serviços de responsabilidade do Estado, cobrar tarifas dos usuários e ainda receber pagamento do Estado por isso, só pode ser considerado uma aberração. Não é à toa que o grande lobby responsável pela aprovação das PPP’s veio das grandes empreiteiras e dos fundos de pensão. Será que, ao idealizar as PPP’s, o Governo, esqueceu o célebre ditado de que não há almoço de graça, esperando que a iniciativa privada simplesmente abrisse seus cofres para realizar investimentos? É claro que não.
As parcerias público-privadas, na prática, possibilitam a pura e simples transferência de recursos públicos para a iniciativa privada. E, obviamente, de responsabilidade também.


03.2 - Programa Universidade Para Todos (Lei Nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005) – Uma Parceria entre o Governo e os Empresários do Ensino Superior Privado

A Reforma Universitária em curso reforça a noção de publico não estatal, trazida por Bresser Pereira, considerando a educação como um bem público, mas que pode ser prestado pelo setor privado. Deste modo, argumenta que as instituições de ensino superior privadas prestam um serviço público, o que justifica a destinação de verbas públicas para o setor privado. Neste contexto foi aprovado o Programa Universidade para Todos – Prouni.
O Programa foi originalmente apresentado pelo Projeto de Lei Nº 3.582, de maio de 2004. Na Câmara, recebeu 292 emendas, mas mesmo antes da votação pelo Congresso, o Governo fechou um acordo com várias instituições privadas, e, em 10 de setembro de 2004, o Prouni passou a vigorar como a Medida Provisória Nº 213 – o que demonstra o autoritarismo do Governo Lula, que vem baixando um número excessivo de MP’s.
Após muitas idas e vindas entre o Congresso e a Câmara, que renderam ao programa diversas emendas, o Programa Universidade para Todos foi sancionado pelo Executivo no dia 13 de janeiro de 2005, como a Lei 11.906, e regulamentado em 18 de julho de 2005 pelo Decreto 5.493.
O Prouni é, segundo o Governo, uma forma de democratizar o acesso ao ensino superior no Brasil. De acordo com artigo 8º da Lei do Prouni, as Instituições Privadas de Ensino Superior que aderirem ao programa estarão isentas, por um período de dez anos (renovável por iguais períodos), do pagamento dos seguintes tributos: do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ), da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), da Contribuição Social sobre o Lucro Liquido (CSLL) e da Contribuição para o Programa de Integração Social (Pis/Pasep).
Como contrapartida, as instituições vinculadas ao Programa Universidade para Todos, deverão destinar bolsas de estudo, integrais ou parciais, para que estudantes “carentes” tenham acesso ao ensino superior.
O artigo 1º dispõe que as bolsas integrais serão concedidas para os estudantes com renda familiar per capita de até um salário mínimo e meio, e as bolsas parciais (50% ou 25%) serão concedidas para estudantes cuja renda familiar per capita não exceda o valor de três salários mínimos.
De acordo com o artigo 2º, as bolsas serão destinadas para: estudantes que tenham cursado todo o ensino médio na rede pública, ou na condição de bolsista integral em instituições privadas; estudantes portadores de necessidades especiais; e professores da rede pública de educação básica, para cursos de licenciatura e pedagogia, destinados à formação do magistério.
Para concorrer ao Prouni, é estabelecido que o estudante deverá ter obtido resultados satisfatórios no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Também será considerado o “percentual de autodeclarados pretos, pardos e indígenas na respectiva unidade de Federação segundo o último censo da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia Estatística – IBGE” (art 7º § 1º).
A vinculação de uma instituição ao Prouni, segundo o artigo 7º § 4º, está condicionada aos resultados obtidos no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES. Deste modo, caso um curso obtenha resultado insuficiente por três avaliações consecutivas será desvinculado do programa, sendo as bolsas distribuídas proporcionalmente pelos demais cursos da instituição.
A Lei do Prouni dispõe que“A instituição privada de ensino superior, com fins lucrativos ou sem fins lucrativos não beneficente, poderá aderir ao Prouni mediante assinatura de termo de adesão, cumprindo-lhe oferecer, no mínimo, 1 (uma) bolsa integral para o equivalente a 10,7 (dez inteiros e sete décimos) estudantes regularmente pagantes e devidamente matriculados ao final do correspondente período letivo anterior” (art 5º). O mesmo artigo dispõe ainda que em substituição ao que está previsto no caput do artigo (transcrito acima), a instituição poderá “oferecer 1 (uma) bolsa integral para cada 22 (vinte e dois) estudantes regularmente pagantes e devidamente matriculados em cursos efetivamente nela instalados, conforme regulamento a ser estabelecido pelo Ministério da Educação, desde que ofereça, adicionalmente, quantidade de bolsas parciais de 50% (cinqüenta por cento) ou de 25% (vinte e cinco por cento) na proporção necessária para que a soma dos benefícios concedidos na forma desta Lei atinja o equivalente a 8,5% (oito inteiros e cinco décimos por cento) da receita anual dos períodos letivos que já têm bolsistas do Prouni”.
A Lei condiciona, no artigo 10, a caracterização de uma entidade como beneficente, ou de assistência social, à destinação de 1 (uma) bolsa de estudo integral para estudante sem diploma de graduação, para cada 9 (nove) estudantes pagantes e devidamente matriculados.
O mesmo artigo dispõe ainda que a instituição considerada como beneficente ou de assistência social deverá “aplicar anualmente, em gratuidade, pelo menos 20% (vinte por cento) da receita bruta proveniente da venda de serviços, acrescida da receita decorrente de aplicações financeiras, de locação de bens, de venda de bens não integrantes do ativo imobilizado e de doações particulares, respeitadas, quando couber, as normas que disciplinam a atuação das entidades beneficentes de assistência social na área da saúde” (§ 1º). O inciso seguinte prevê que serão contabilizadas para o cumprimento deste percentual, “as bolsas parciais de 50% (cinqüenta por cento) ou de 25% (vinte de cinco por cento)”.
As entidades beneficentes, ou de assistência social que aderirem ao Prouni, de acordo com o artigo 11, deverão “oferecer 20% (vinte por cento), em gratuidade, de sua receita anual efetivamente recebida”, através das bolsas de estudo integrais ou parciais. Para atingir este percentual, estas instituições deverão “oferecer, no mínimo, 1 (uma) bolsa de estudo integral, (...) para cada 9 (nove) estudantes pagantes de curso de graduação ou seqüencial de formação específica regulares da instituição, matriculados em cursos efetivamente instalados”. Ainda no mesmo artigo fica estabelecido que as instituições que adotarem as regras do Prouni ficam dispensadas do cumprimento do previsto no § 1º do artigo 10 (transcrito no parágrafo anterior).
É importante ressaltar que a medida provisória, editada pelo Governo Lula em setembro de 2004, previa que as instituições sem fins lucrativos vinculadas ao Prouni deveriam conceder bolsas de estudo integrais ou parciais (cinqüenta por cento), não mencionando bolsas de 25%, como na Lei aprovada. Além disso, a MP dispunha também que os benefícios concedidos pelas instituições não beneficentes deveriam atingir o equivalente a 10% da receita anual, e não 8,5%.
Vale destacar também, que a exigência da concessão de 25% de bolsas integrais para instituições consideradas como beneficentes, ou de assistência social, prevista no Projeto Original, foi reduzida para 10%, quando da aprovação da Medida Provisória, percentual este mantido na Lei sancionada em 13 de janeiro.
O artigo 12 da Lei do Prouni prevê que as instituições vinculadas ao programa podem considerar como bolsistas “trabalhadores da própria instituição ou dependentes destes (...) até o limite de 10% das bolsas concedidas”. Deste modo, a instituição pode ser beneficiada com a isenção de impostos em troca de bolsas para seus próprios funcionários, bolsas estas que já são normalmente concedidas, via acordo entre as partes, sem que o Governo tenha qualquer participação.
Outra questão, não menos importante, é o que dispõe o artigo 13 da Lei do Prouni. O referido artigo prevê que as instituições mantenedoras, que gozam da isenção para seguridade social, poderão migrar para o regime jurídico de fins econômicos e “passarão a pagar a quota patronal para a previdência social de forma gradual durante o prazo de 5 (cinco) anos, na razão de 20% (vinte por cento) do valor devido a cada ano, cumulativamente, até atingir o valor integral das contribuições devidas”. Sendo assim, as entidades “sem fins lucrativos”, que durante anos e anos gozaram de isenção tributária, poderão tornar-se entidades com fins lucrativos, migrando todo o patrimônio acumulado às custas do Estado, para o setor privado, sendo dispensadas do pagamento integral dos tributos por cinco anos.
Desde a sua apresentação como Projeto de Lei, em maio de 2004, o Prouni sofreu diversas alterações após as pressões por parte dos empresários do setor privado. Houve uma efetiva atuação dos atores sociais representados pelas associações e instituições de educação superior privadas. Nesse jogo político o MEC tornou-se um representante de interesses privados que foram, em sua maioria, plenamente atendidos.
Alguns pontos que tornaram o projeto ainda mais contestável foram: flexibilização da obrigatoriedade da destinação de bolsas integrais para a obtenção de isenção fiscal (art 1º); autorização para que as instituições ampliem o número de vagas na proporção das bolsas oferecidas (art 7º § 3º); flexibilização do processo de avaliação, pois, como foi aprovada, a lei estabelece que em caso de desempenho insuficiente no processo de avaliação será desvinculado apenas o curso considerado insuficiente e não a instituição (art 7º § 4º); as instituições vinculadas ao Prouni terão prioridade na distribuição de recursos disponíveis no Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior – Fies (art 14); redução da participação de professores da rede pública apenas aos cursos de licenciatura, normal superior e pedagogia, destinados à formação do magistério da educação básica (art 2º, III).
Após a sua regulamentação, pelo Decreto 5.493, de julho de 2005, o Prouni já foi alterado por diversas Portarias, que o tornaram ainda mais contestável, além de confirmarem o poder de barganha dos empresários da educação superior privada perante o Governo Federal.
A Lei 11.180, de 23 de dezembro de 2005, autoriza no artigo 11 a concessão de bolsa-permanência no valor de até R$ 300,00 (trezentos reais) para estudantes beneficiários do Prouni matriculados em curso de turno integral.
A Portaria nº 569, de 23 de fevereiro de 2006, que regulamenta o referido artigo, dispõe que “a bolsa-permanência será concedida a estudantes matriculados em cursos de agronomia, ciência da computação, enfermagem, engenharias, farmácia, fisioterapia, informática, medicina, odontologia e veterinária, com no mínimo 6 (seis) semestres de duração e cuja a carga horária média seja superior ou igual a 6 (seis) horas diárias de aula”. A Portaria define também que as bolsas-permanência somente serão concedidas a beneficiários de bolsas integrais e, exclusivamente, durante o prazo mínimo de integralização do curso. Segundo o artigo 3º § 3º “A aprovação no processo de seleção para a bolsa-permanência, inclusive com emissão do respectivo Termo de Concessão, assegurará apenas a expectativa de direito ao recebimento mensal da bolsa, ficando o seu efetivo pagamento condicionado à disponibilidade orçamentária e financeira do Ministério da Educação e à observância das demais disposições legais pertinentes”.
Ao condicionar a concessão da bolsa a matrícula em turno integral e à conclusão do curso no período mínimo estabelecido, o Governo impede que o estudante beneficiário exerça outro tipo de atividade que venha a complementar a sua renda, pois, de um modo geral, estudantes que trabalham para complementar a renda familiar estudam no noturno e não concluem o curso no período mínimo. Ao mesmo tempo, o Governo se isenta da obrigação do pagamento da bolsa, ao afirmar que aprovação da bolsa garante apenas a “expectativa do direito ao recebimento”. Ou seja, o estudante deve atender a uma série de pré-requisitos para fazer jus a uma bolsa que nem ao menos lhe é garantida pelo Governo.
Outro fator que chama a atenção é opção do Governo por priorizar a assistência estudantil aos estudantes do setor privado, negligenciando a assistência aos estudantes do ensino superior público. Segundo dados do relatório de gestão da UFBA de 2005, apenas 60% dos estudantes que ingressam na Universidade concluem a graduação.
A Portaria nº 1.861 de 1º de junho de 2005 regulamenta a concessão do financiamento pelo Fies para estudantes beneficiários do Prouni. Deste modo, o Governo financia a parte restante da mensalidade dos estudantes selecionados para as bolsas parciais. Vale lembrar que a concessão de bolsas parciais pelo Prouni foram instituídas por pressão dos empresários das instituições privadas.
Ao regulamentar o financiamento pelo Fies para bolsistas do Prouni, o Governo além de conceder isenções fiscais e previdenciárias em troca de bolsas de estudo, ainda paga a outra parte desta mesma bolsa, que será posteriormente cobrada do estudante - que supostamente após a conclusão do ensino superior terá recursos para arcar com essa despesa.
O então Ministro da Educação Tarso Genro, em pronunciamento dado, no dia 07 de junho de 2004, acerca dos princípios e diretrizes da Reforma do Ensino Superior, afirmou que, no caso do sistema privado são “dispositivos legítimos” a desoneração tributária e o financiamento direto aos estudantes (FIES). Além disso, o documento elaborado pelo Grupo de Trabalho Interministerial, em outubro de 2003, menciona uma possível desoneração integral de tributos de todas as instituições de ensino, que deveriam apresentar alguma “contrapartida social”. Essa desoneração representaria um verdadeiro “negócio da China” para os empresários da educação superior privada.
A Portaria nº 301, de 30 de janeiro de 2006 institui a Comissão Nacional de Acompanhamento e Controle Social do Prouni (CONAP), que é um órgão colegiado de atribuições consultivas vinculado à Secretaria da Educação Superior. De acordo com a referida Portaria, a CONAP deve ter a seguinte composição: 2 (dois) alunos de instituições privadas de educação superior, sendo pelo menos um deles bolsista do Prouni; 2 (dois) estudantes do ensino médio público; 2 (dois) representantes do corpo docente de instituições privadas de educação superior, sendo ambos professores em regime integral; 2 (dois) dirigentes de instituições de ensino superior privado; 2 (dois) representantes da sociedade civil; e 2 (dois) representantes do Ministério da Educação. Os membros da sociedade civil participantes da CONAP, segundo o artigo 2º § 5º serão designados pelo Ministério da Educação, ou seja, o MEC tem maior representatividade na comissão.
O Prouni é colocado pelo Governo como uma forma de facilitar o acesso de estudantes de baixa renda à Universidade. Entretanto, este aumenta o montante dos recursos públicos destinados ao setor privado e cria o mito da “inclusão social” - facilitando o acesso ao ensino superior privado, mas negligenciando que o fato de estar na Universidade por si só não garante inclusão social.
A lógica propagada é a de que o setor privado é mais eficiente no fornecimento do ensino superior, e, portanto o governo deve subsidiar este setor. Esta lógica está presente nas parcerias público privadas, que tomam como um dado o fato de que o setor privado é mais eficiente do que o setor público. Deste modo, o Prouni representa uma materialização da PPP’s no ensino superior brasileiro.
Outro argumento utilizado pelo MEC em defesa do Prouni é a elitização da Universidade pública, cuja solução seria a abertura de vagas públicas em Universidades privadas. Entretanto, segundo o deputado petista Ivan Valente e o professor Otaviano Helene (ex-presidente da Adusp e do Inep), a elitização nas Universidades está mais relacionada ao curso do que ao caráter institucional.
O Governo também argumenta que é mais barato financiar as instituições privadas do que as instituições públicas. Entretanto, isto se constitui em mais uma mentira. Segundo o professor Otaviano Helene em debate na UNICAMP, ao dividir o orçamento de uma Universidade pública ou privada pelo número de alunos, o custo no setor público é aparentemente maior. Todavia, alguns aspectos devem ser considerados ao se fazer tal afirmação. Segundo o professor “o ensino privado concentra 67% de suas matrículas no noturno e quase 50% dos alunos estão em cursos de Administração, Direito, ou similares, que são cursos baratos porque não demandam partes muito caras como laboratórios. Os cursos de medicina e outros relativamente caros estão concentrados no setor público (...)”.
Deve ser levado em consideração também o fato de que as Universidades públicas realizam outras atividades, como pesquisa e atendimento em hospitais universitários, que por serem mais caras não são oferecidas pela maioria das instituições privadas, que optam por oferecer apenas o que há de mais barato e “industrializável” – o ensino. Além disso, é contabilizado também no gasto com das Universidades públicas a folha de pagamento dos aposentados, já no setor privado quem paga as aposentadorias não é a Universidade, é o INSS ou um fundo de previdência.
É no mínimo curioso o fato de que o Governo Lula, que tanto se esforçou para aprovar a Reforma da Previdência, no ano de 2003, alegando a existência de um rombo nas contas da previdência social, agora isente, por dez anos (renovável por iguais períodos), as instituições de ensino superior privadas do pagamento da sua parte para a previdência social (Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social). O mesmo Governo que não mediu esforços para combater os supostos “privilégios” dos servidores públicos, oferece cada vez mais privilégios para os grandes empresários das instituições de ensino superior privadas.
De acordo com dados do INEP, em 2005 a renúncia fiscal concedida às instituições de ensino superior privado inscritas no Prouni totalizaram R$ 105 milhões. Foram 112.275 bolsas concedidas no ano de 2005. No primeiro semestre de 2006 o montante das bolsas totalizou 91.609, segundo dados do MEC.
O Prouni, ao contrário do que prega, tem como grandes beneficiários os empresários do ensino superior privado. Pois as IES privadas encontram-se, “supostamente”, com um grande índice de vagas ociosas, que junto com a inadimplência, seria o grande vilão dos empresários da educação. Sendo assim, o Prouni só traz benefícios para estas empresas, pois as isenta do pagamento de diversos tributos, e preenche as vagas que estão “supostamente” ociosas.
É importante ressaltar que o Projeto, após a pressão exercida pelos empresários, deixa a critério da instituição a distribuição das bolsas, podendo esta destiná-las aos cursos com menor concorrência, ou ainda àqueles com maior índice e inadimplência. E que este suposto índice de ociosidade, pode não passar de um “estoque estratégico” das instituições - afinal, nada garante que estas possuem infra-estrutura, ou mesmo professores, esperando para atender aos estudantes “beneficiados” pelo Prouni. De acordo com o professor Otaviano Helene, com o crescimento do ensino superior privado, no ano de 2002 o número de concluintes do ensino médio era praticamente igual ao número de vagas oferecidas no ensino superior: 1,9 milhões e 1,8 milhões, respectivamente. Ainda segundo o professor “Além dessas 1,8 milhões de vagas oferecidas, o setor privado tem um enorme estoque “estratégico” de vagas, que não ousa oferecer porque sabe que não tem clientela”
Outro engano é acreditar na permanência dos alunos nas IES privadas, já que estas não disponibilizam condições adequadas – ausência de assistência médica, residências universitárias, alimentação subsidiada, um sistema realmente favorável de bolsa-permanência e outros instrumentos de gratuidade ativa, que se constituem em condições indispensáveis para a permanência de um estudante de baixa renda na Universidade.
Ainda de acordo com o professor Otaviano Helene e o Deputado Ivan Valente, é comprovada a existência de um maior índice de evasão nas instituições privadas, não só pela falta de condições adequadas e da impossibilidade de pagar a mensalidade, mas também pela frustração com a má qualidade dos cursos oferecidos.
Vale ressaltar também que os impostos dos quais as instituições privadas de ensino superior são isentadas são todos voltados para o social, e que a concessão de isenções fiscais e previdenciárias, que é incentivada pelo Prouni, significa menos verbas para os gastos públicos. Deste modo, ganham os empresários, que certamente lucrarão bastante com todos os privilégios que lhes são concedidos pelo programa; ganha o Governo, que finge estar promovendo inclusão social; perde a sociedade, com a renúncia fiscal e previdenciária por parte dos empresários da educação; e para os estudantes se oferece uma suposta inclusão social, facilitando sua entrada em instituições de qualidade duvidosa, e sem qualquer garantia de assistência estudantil.


03.3 - Lei de Incentivo à Inovação e à Pesquisa Científica e Tecnológica (Lei Nº 10.973, de 02 de dezembro de 2004) - Uma Parceria entre a Universidade, os Institutos de Pesquisa e o Setor Produtivo Nacional

A Lei de Incentivo à Inovação e à Pesquisa Científica e Tecnológica, aprovada pelo Senado Federal no dia 11 de novembro de 2004, e sancionada pelo Presidente Lula no dia 02 de dezembro de 2004, no contexto da Reforma Universitária, nada mais é do que a regulamentação de uma parceria entre as universidades, os institutos de pesquisa e a iniciativa privada, que aprofunda a lógica da privatização da pesquisa desenvolvida nas universidades brasileiras.
De acordo com o Governo, a Lei representa uma forma de dinamizar a relação entre Universidades, institutos de pesquisa e o setor produtivo nacional. Segundo estes, a produção científica, em especial a proveniente das Universidades Públicas, não interage como deveria com o setor produtivo. Sendo assim, este setor não incorpora a tecnologia produzida, tornando os produtos pouco competitivos no mercado.
O Ministério da Ciência e Tecnologia afirma que o primeiro passo para que haja um aumento consistente na pesquisa científica no Brasil é a criação de mecanismos que regulem a união de esforços entre a iniciativa pública e a privada. De acordo com o Ministro Eduardo Campos, em declaração à imprensa, a Lei “permitirá que o conhecimento acumulado nas instituições de pesquisa seja oferecido à economia brasileira, para melhorar a produtividade e a capacidade de competir com o mercado global”.
O Capítulo II da Lei de Incentivo à Inovação Tecnológica trata do “estímulo ao ambiente de inovação”, estabelecendo que a ICT (Instituição Científica e Tecnológica), que se constitui em um órgão da administração pública, pode compartilhar e permitir a utilização de seus laboratórios a empresas de pequeno porte, além de participar minoritariamente do capital de uma empresa privada que vise o desenvolvimento de projetos científicos e tecnológicos.
No Capítulo III a Lei estabelece regras para que o pesquisador público desenvolva pesquisas voltadas para inovação e o incremento tecnológico. O artigo 8º, um dos mais criticados no meio acadêmico, estabelece que “O servidor, o militar ou o empregado público envolvido na prestação de serviço prevista no caput deste artigo poderá receber retribuição pecuniária, diretamente da ICT ou de instituição de apoio com que esta tenha firmado acordo, sempre sob a forma de adicional variável e desde que custeado exclusivamente com recursos arrecadados no âmbito da atividade contratada”.
A Lei também prevê uma nova categoria de “bolsa de estímulo à inovação”, destinada aos pesquisadores públicos (art 9º § 1º). E possibilita, no art 15, o afastamento por um prazo de até três anos, renovável por igual período, do pesquisador público que tenha interesse em estabelecer atividade empresarial relativa à inovação. Sendo assim, o pesquisador não será incentivado a desenvolver trabalhos na ICT e não será valorizado o caráter público e social do conhecimento produzido. Será incentivada a pesquisa voltada para o mercado e o lucro.
De acordo com o artigo 12 da Lei “É vedado ao dirigente, ao criador ou a qualquer servidor, militar, empregado ou prestador de serviços de ICT divulgar, noticiar ou publicar qualquer aspecto de criações de cujo desenvolvimento tenha participado diretamente, ou tomado conhecimento por força de suas atividades, sem antes obter expressa autorização da ICT”. Este artigo, não só agride o preceito constitucional que prevê a autonomia didático-científica das universidades, como também aos preceitos constitucionais de liberdade de produção, expressão, e circulação de conhecimentos e saberes. Na prática, a lei “coloca uma mordaça” em todos os docentes, funcionários ou estudantes envolvidos com o projeto de pesquisa.
O artigo 13 trata da participação das ICTs nos lucros obtidos nos projetos feitos em parceria com as empresas privadas. Este artigo estabelece que “é assegurada ao criador a participação mínima de 5% (cinco por cento) e máxima de 1/3 (um terço) nos ganhos econômicos”. Ou seja, incentiva, mais uma vez, a pesquisa voltada para o interesse do mercado capitalista.
A Lei de Incentivo à Pesquisa e à Inovação Tecnológica e Científica prevê, no artigo 19, que a União, as ICTs e as agências de fomento deverão promover e incentivar o desenvolvimento de produtos e processos inovadores no setor produtivo nacional, fornecendo recursos financeiros, humanos, materiais, ou de infra-estrutura às empresas nacionais de direito privado. O mesmo artigo dispõe ainda que o Poder Executivo assegurará a destinação de um “percentual mínimo dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT” (§ 4º), para projetos de inovação, com prioridades às áreas definidas como estratégicas na política industrial.
Deste modo, a Lei autoriza o aporte de recursos orçamentários diretamente à empresa, no âmbito de um projeto de inovação, estabelecendo um ambiente de interação entre a iniciativa pública e o setor produtivo, que beneficiará diretamente a este último pela possibilidade de explorar economicamente produtos e processos resultantes de linhas de pesquisa desenvolvidas nas universidades. Além disso, incentiva acordos livres entre as ICTs e o mercado, sem qualquer forma de controle social.
Na prática, isto significa repasse de recursos públicos para o setor empresarial, seguindo a mesma lógica das parcerias público-privadas, ou seja, todas as garantias para o setor privado são asseguradas pelo Estado. Além disso, a Lei fere mais uma vez a autonomia universitária, na medida em que condiciona o repasse de recursos à “relevância” do projeto, e impede a divulgação destes por parte dos seus criadores.
Em suma, a Lei prevê que o incentivo à pesquisa e produção do conhecimento, que possa ser inserido no processo produtivo deve ser garantido por recursos públicos. Entretanto, não menciona o incentivo à construção do conhecimento socialmente relevante, que não esteja vinculado à inovação tecnológica ou ao processo produtivo. Pressupõe o incentivo à produção do conhecimento, desde que esta seja voltada para o mercado. Sendo assim, inviabiliza toda a pesquisa que não seja voltada para o interesse do mercado capitalista.
O objetivo desta Lei nada mais é do que transformar as instituições públicas de ensino superior em espaços de adequação tecnológica e de prestação de serviços à iniciativa privada. Deste modo, agride o próprio conceito de Universidade como uma instituição social, transformando-a em uma organização a serviço das demandas do mercado.


03.4 - Projeto de Emenda Constitucional Nº 217, de 2003 –Uma Afronta à Gratuidade do Ensino Superior Público

A Reforma Universitária vem sendo construída a passos largos pelo Governo Lula. Ainda em 2003, primeiro ano do Governo, foi encaminhada a Proposta de Emenda Constitucional Nº 217, que trata da diversificação das fontes de financiamento da educação superior.
O Projeto permaneceu durante meses na CCJC (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) aguardando parecer do relator. No dia 28 de abril de 2005 foi designado relator o Deputado Professor Luizinho (PT–SP).
A PEC 217, proposta pela Deputada Petista Selma Schons, altera o artigo 212 da CF 88, aumentando a porcentagem dos impostos vinculados à manutenção e desenvolvimento do ensino – MDE.
De acordo com esta proposta, a União, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão 25%, e os Estados 30% de parte de sua receita para a educação. Atualmente, de acordo com o artigo 212 da CF 88, a União deve vincular para a educação 18% da receita de alguns impostos federais, depois de retirado o repasse legal para os Estados e Municípios. A base de cálculo é sobre a receita dos seguintes impostos: Importação (II), Exportação (IE), Imposto de Renda (IR), Produtos Industrializados (IPI), Operações Financeiras (IOF), Imposto Territorial Rural (ITR). Já os Estados, o Distrito Federal e os Municípios destinam 25% de alguns impostos, entre eles Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o Imposto Sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), e o Imposto Sobre a Transmissão de Causas Mortis e Doação (ITCMD).
A PEC, também propõe que pelo menos 75% dos impostos vinculados da União, sejam destinados à educação superior, constituindo o Fundes – Fundo Nacional de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Superior.
Além de alterar os dispositivos de vinculação dos impostos, a PEC 217 também propõe, a instituição de uma fonte adicional de financiamento para a educação – uma Contribuição Social. De acordo com a proposta, deverão pagar esta contribuição os portadores de diplomas de graduação e pós-graduação (mestrado e doutorado), beneficiados por cursos superiores gratuitos. A proposta estipula uma alíquota de 2% para aqueles com renda bruta anual média de R$35.000,00, e 3% para aqueles com renda bruta anual média de R$70.000,00.
A CES (Contribuição Social para a Educação Superior), segundo a Deputada, será creditada na conta da Universidade ou Instituição de Ensino Superior onde foi diplomado o contribuinte, proporcionando desta forma um aumento das vagas e uma melhoria salarial dos profissionais da educação.
Segundo a Deputada, estas medidas poderiam resolver parte dos problemas enfrentados pelas Universidades. Entretanto, é importante lembrar alguns pontos que contribuem para o falacioso discurso da falta de verbas para investir em educação.
A CF 88 prevê, que a União deverá destinar nunca menos de 18% da receita de alguns impostos à Educação. Entretanto, parte da receita da União é desvinculada através de DRU – Desvinculação das Receitas da União, que permite ao Governo Federal a retirada de 20% dessa receita, que seria da educação, para ser gasta como quiser. Segundo dados do Estado de São Paulo de 11 de junho de 2004, este ano sobrou apenas 9,8% da receita dos impostos, após o repasse para os Estados e Municípios, graças à desvinculação através da DRU.
Vale lembrar que a arrecadação dos impostos tem crescido bem menos nos últimos anos do que a dos demais tributos (taxas e contribuições). A receita dos impostos é cada vez mais contingenciada em função das isenções fiscais concedidas pelo governo e também da sonegação e da elisão fiscal. Sendo assim, porque não vincular a verba da educação às taxas e contribuições?
A cobrança dos alunos egressos do ensino superior público, através da instituição da CES é mais uma forma de bitributação, tendo em vista que a educação é financiada por impostos e todos nós pagamos impostos. Além disso, é incoerente e mentiroso todo o discurso da Deputada em favor da instituição desta Contribuição Social: primeiro, porque suprime a gratuidade dos cursos superiores; segundo, porque pressupõe que os egressos da Universidade possuem uma renda média que lhes capacita a contribuir com tão alto valor para a Universidade, aumentando a carga tributária que no Brasil é comparável à dos países desenvolvidos; terceiro, porque, apesar do discurso da Deputada de que a arrecadação da CES será repassada diretamente para as Instituições, nada impede que, posteriormente, esta seja desvinculada, como já acontece, por exemplo, desde 1993, através da DRU (antes denominada de FSE e FEF), com a verba que é prevista constitucionalmente para a educação.
Após o que foi apresentado, fica claro, que a proposta da Deputada Selma Schons é mais uma das tantas inseridas na lógica neoliberal que pretende privatizar a Universidade pública brasileira, privando a sociedade de um direito constitucional básico - a educação.


03.5 - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Lei Nº 10.861, de 14 de Abril de 2004) – Uma Afronta à Autonomia Universitária

Diante da lógica neoliberal, na qual está inserida a Reforma Universitária proposta pelo Governo Lula, reserva-se ao Estado o papel de fiscalizar, avaliar, e punir a educação superior brasileira. Neste contexto, foi aprovada a Lei Nº 10.861, de 14 de abril de 2004, que institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES, regulamentada pela portaria nº 2051 de 09 de julho de 2004, que trata dos procedimentos de avaliação da educação superior.
Segundo o art 1º da lei 10.861/04, o SINAES tem por objetivo “avaliar as instituições de educação superior, os cursos de graduação e o desempenho acadêmico dos estudantes, resultando desta avaliação uma escala com cinco níveis”.
E, ainda de acordo com o art 31 da Portaria do MEC, os processos avaliativos do SINAES “subsidiarão o processo de credenciamento e renovação de credenciamento de instituições, e a autorização, o reconhecimento e a renovação de reconhecimento de cursos de graduação”.
O INEP será o órgão do MEC responsável pela sua operacionalização, a partir das diretrizes e normas definidas pela CONAES - Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior, que de acordo com o art 6º da Lei do SINAES, será responsável pela coordenação e a supervisão do Sistema de Avaliação.
A ela, são designadas atribuições como: propor e avaliar os mecanismos de avaliação das instituições, dos cursos e dos estudantes; formular propostas para o desenvolvimento das instituições de educação superior; submeter ao MEC a relação dos cursos que serão avaliados; além de estabelecer as diretrizes para a constituição das CPA’s (Comissão Própria de Avaliação).
A avaliação é dividida em três etapas: auto-avaliação; avaliação externa e aplicação de avaliação de desempenho dos estudantes. A primeira é coordenada pela já citada CPA; a segunda é realizada por comissões designadas pelo INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira e a terceira será realizada através da aplicação do Enade (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes). Substituto do Provão, possui caráter curricular obrigatório e será aplicado periodicamente, num intervalo máximo de três em três anos para cada curso. Devem realzia-lo estudantes do primeiro e do último ano do respectivo curso e sua aplicação é, também, de responsabilidade do INEP.
De acordo com o art 11 da Lei do SINAES “Cada instituição de ensino superior, pública ou privada, constituirá Comissão Própria de Avaliação - CPA, no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da publicação desta Lei (14 de abril de 2004), com as atribuições de condução dos processos de avaliação internos da instituição, de sistematização e de prestação das informações”. Essa comissão será constituída “por ato do dirigente máximo da instituição de ensino superior, ou por previsão no seu próprio estatuto ou regimento, assegurada a participação de todos os segmentos da comunidade universitária e da sociedade civil organizada, e vedada a composição que privilegie a maioria absoluta de um dos segmentos”.
Para a avaliação externa, segundo a art 6º da Portaria do MEC, serão designadas pelo INEP Comissões Externas de Avaliação Institucional e Comissões Externas de Avaliação de Cursos. Entretanto, nem a Lei 10.861/04 e nem a Portaria 2051/04 esclarecem a composição destas comissões. Deixando esta brecha, é permitido que essas comissões sejam compostas da maneira mais conveniente para o Governo, é claro.
É importante ressaltar que esta comissão, que será a grande responsável pelas ações relativas ao SINAES, possui uma composição majoritariamente governista. É composta por treze membros, sendo: um representante do INEP, um representante da CAPES, três representantes do MEC, um representante do corpo discente, um do corpo docente e um do corpo técnico-administrativo, e cinco membros indicados pelo MEC. Vale destacar que a comissão será presidida por um destes cinco membros indicados pelo MEC. Sendo assim, todo o processo de avaliação estará subjugado ao Ministério.
Ligado a isto, encontra-se uma das principais críticas feitas a esse novo sistema: o de subjugar a autonomia universitária, conferindo ao MEC atributos para avaliar, punir e definir as políticas da Universidade. Deste modo, fere o principio constitucional, contido no art 207, que prevê que “As universidades gozam de autonomia, didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial”.
O art 3º da Lei do SINAES estabelece alguns pontos que serão considerados no processo de avaliação institucional. Dentre estes pontos vale destacar a sustentabilidade financeira da instituição. Estabelecendo tal critério para a avaliação, a lei favorece a mercantilização da educação superior, obrigando as instituições públicas a buscarem recursos através de parcerias com a iniciativa privada e do fornecimento de cursos pagos. Parace no mínimo uma contradição: como avaliar a sustentabilidade financeira de uma instituição que é responsabilidade do próprio MEC financiar? Caso uma instituição pública tenha uma avaliação negativa em aspectos como: “Há compatibilidade entre cursos oferecidos e as verbas e os recursos disponíveis? As obrigações trabalhistas estão sendo cumpridas? Os equipamentos necessários para o desenvolvimento do Projeto Pedagógico Institucional são atualizados em número e em qualidade? Há uma política de espaço físico para atualização e adequação das instalações no atendimento das demandas da IES? Compõe o orçamento a destinação de verbas para capacitação de docentes e técnicos-administrativos?”(promissas que estão presentes nas orientações do INEP para realização da auto-avaliação) , quem seria considerado o verdadeiro culpado pelo problema: a instituição ou o MEC?
Este aspecto traz a tona um outro problema ocasionado por este sistema: instituições públicas e privadas são tratadas quase que de maneira indistinta, sendo avaliadas por critérios bastante semelhantes.
De acordo art 28 da Portaria do MEC “O ENADE é componente curricular obrigatório dos cursos de graduação, sendo o registro de participação condição indispensável para a emissão do histórico escolar, independentemente do estudante ter sido selecionado ou não na amostragem”. Sendo considerado como componente curricular obrigatório, o ENADE tem caráter punitivo, exercendo peso significativo para o ex-aluno em qualquer processo de seleção ao qual este venha a se submeter. O exame apresenta, também, um caráter meritocrático, e que lembra os métodos difundidos pelo toyotismo na segunda metade de século XX, pois, de acordo com § 10º do mesmo artigo, o Ministério da Educação concederá estímulos e distinções aos estudantes com melhor desempenho.
Já em seu terceiro ano de aplicação, a sua realização é questionada por diversos setores da sociedade, especialmente segmentos do movimento estudantil e do movimento docente. Diversas executivas de curso defendem o “boicote ao Enade” por não acreditarem que os critérios de ranqueamento, de indiferenciação entre público e privado, de desrespeito às características regionais, e de valorização de modelos gerenciais empresariais sejam os ideais para avaliarem, e servirem de diretrizes para as Instituições de Educação Superior.
Caso os resultados da avaliação sejam considerados insatisfatórios, a lei do SINAES prevê no artigo 10, que a instituição deverá assinar um protocolo de compromisso, e o descumprimento deste implicará na aplicação de sanções, podendo a instituição ter cassada a autorização para o seu funcionamento ou o reconhecimento dos seus cursos. Este protocolo se configura em mais uma afronta à autonomia prevista constitucionalmente para as Universidades.
O ranqueamento, outra característica da metodologia defendida pelo MEC, já tem sido utilizada como ferramenta de propaganda de instituições, especialmente particulares. Segundo pesquisa realizada pela CM Consultoria, e divulgada pelo site Universia, 61% das instituições de Ensino Superior brasileiras afirmaram que utilizarão as informações do resultado do Enade em “sua estratégia de marketing e comunicação como ferramenta para se diferenciar no mercado”.
Cabem, ainda, mais algumas criticas ao sistema de avaliação em questão: Pouca valorização da integração ensino-pesquisa-extensao; utilização de conceitos que podem ser entendidos de maneiras dúbias como mérito, compromisso social, sociedade civil (que, como diria Bourdieu, para os neoliberais, se trata do mercado); Não há clareza sobre quem deve recair a responsabilidade sobre os custos do processo de avaliação, especialmente a avaliação externa; avaliação por amostragem é a melhor solução? Esse método de avaliação realmente dá conta das características regionais intrínsecas a cada instituição ou prima por tentar adotar um modelo cada vez mais uniforme de Ensino Superior? Quais as diretrizes para avaliação da educação a distancia?
Diante do que foi exposto, conclui-se que o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior mantém a mesma lógica do provão, subjugando a autonomia universitária e submetendo instituições e estudantes a um sistema de avaliação que obedece a critérios esdrúxulos e inconcebíveis.
As instituições de ensino superior devem ser avaliadas. Entretanto devem ser adotados critérios diferenciados para as instituições públicas e as privadas, e respeitada a autonomia universitária.


03.6 - Anteprojeto da Reforma Universitária – Uma Reafirmação dos Princípios que Norteiam a Reforma do Ensino Superior Brasileiro

O MEC divulgou três versões do anteprojeto da Reforma Universitária, com alterações que progressivamente mercantilizam o ensino superior brasileiro. A análise anterior deste Grupo de Trabalho abordou elementos da primeira versão do Anteprojeto, que esta disponível em meio eletrônico. Neste documento iremos analisar a terceira versão do anteprojeto, esclarecendo quando necessário as mudanças referentes as versões anteriores.
È importante ressaltar que destacamos para análise os principais elementos, mas há diversos outros problemáticos que por razões didáticas não são analisadas aqui. Uma segunda questão, é que temas como Ensino a Distância e SINAES não serão analisados nesta parte, pois já foram trabalhados em outras partes deste documento, evitando assim a repetição de análises.
A versão preliminar do Anteprojeto da Lei da Educação Superior não trouxe surpresas se comparada às formulações anteriormente apresentadas, que foram o documento do Grupo de Trabalho Interministerial, e os dois documentos de diretrizes apresentados pelo Ministério da Educação. O texto aprofunda a lógica da priorização da iniciativa privada, já revelada nos documentos anteriores, negligenciando as reais necessidades do ensino superior brasileiro.
O Anteprojeto não estabelece limites entre o público e o privado, colocando instituições públicas e privadas em situação de igualdade. A diferenciação entre as instituições é feita, somente, pela sua organização acadêmica: universidades, centros universitários e faculdades.
O fim da fronteira entre o público e privado sobre o pretexto de “regular todo o sistema de ensino”, traz fortes prejuízos para a educação. Pois o Anteprojeto estabelece regras iguais para as Universidades Públicas e as “Empresas de Educação”, e essa igualdade traz elementos mercantis, que serão destacados na análise ponto-a-ponto.
No Anteprojeto o art. 2º já apresenta um problema que irá permear todo o texto, pois não exclui entre as instituições que devem obedecer a lei a CAPES (Centro de Aperfeiçoamento de Pessoal Superior) e o CNPQ (Conselho Nacional de Pesquisa). Tais instituições financiam, regulamentam e comandam a pesquisa, pós-graduação e são os principais financiadores públicos para os projetos de extensão. Atualmente tais instituições através dos seus critérios de financiamento e credenciamento, retiram a autonomia das universidades.
Mais a frente, no art 12º, o anteprojeto responsabiliza a CAPES pela condução, regulamentação e financiamento da pós-graduação no país. Todavia, não muda a composição da CAPES para que tenha uma representação real da massa da comunidade acadêmica, nem estabelece as fontes ou aumento de recursos para tal instituição. Assim, a pós-graduação permanece com pouco dinheiro e tendo em sua composição pessoas indicadas pelo MEC. Ou seja, continua reduzindo o financiamento e retira a autonomia.
O art 5º estabelece uma serie de finalidades da educação superior, todavia tais finalidades são incompatíveis, ou no máximo marginais para o setor privado, uma vez que a lógica empresarial prima pela lucratividade, as outras finalidades são marginais, e na maioria dos casos empecilhos a acumulação de capital. Para o setor público, as finalidades são nobres, mas o estrangulamento por falta de recursos não dá condições materiais para a realização das belas palavras da lei, tornando-a “letra morta do direito”.
O art. 6º trata da abrangência do ensino superior, e traz diversos problemas, todos no sentido da integração com as demandas de mercado, vinculando o ensino ao fornecimento de mão-de-obra qualificada para um mercado subdesenvolvido, que demanda técnicos e não acadêmicos. È a instrumentalização da formação superior no sentido de favorecer a acumulação de capital.
- Legitima os cursos de mestrado e doutorado profissionalizantes, inclusive dentro do ensino público. Desta forma normaliza uma prática combatida pelos setores mobilizados dos estudantes e professores, pois tais cursos além de priorizar uma capacitação empresarial ao invés do desenvolvimento pleno do saber, vinculando a produção acadêmica as demandas de mercado, configura-se como receita de venda de serviço pela universidade, abrindo ainda mais as portas para privatização interna, pois os cursos profissionalizantes são vendidos ao mercado, os estudantes pagam (e caro) para cursar.
- Autoriza a formação continuada e os cursos seqüências, de modo que o estudante tendo uma formação incompleta na graduação, e precisando de títulos e certificados que “atestem” sua capacidade de permanecer no mercado de trabalho, precisa retornar constantemente a universidade para se “qualificar” em especializações e mestrados profissionais. Cria-se o mercado de títulos acadêmicos como indicador de qualidade do profissional, pois se tiver um título sobre um tema em voga no mercado, tem mais chances de conseguir emprego ou se manter no que já tem.
- Reduz o tempo de formação mínimo da graduação de quatro para três anos, desprezando uma formação profunda para uma inserção mais rápida de profissionais no mercado. Ao mesmo tempo em que “alivia” os professores do ensino da graduação para que possam se dedicar aos cursos pagos e parcerias lucrativas via Lei de Inovação Tecnológica.
- Insere o caráter tecnológico na formação superior, permitindo cursos de educação profissional com dois anos de duração.

- O Anteprojeto prevê que as instituições de ensino poderão ministrar os “estudos de formação geral” e os “estudos de formação profissional”. Os chamados “estudos de formação geral” deverão ter duração mínima de quatro semestres, e pela sua conclusão, “o estudante receberá certificado de estudos superiores, com validade acadêmica de âmbito nacional”. O objetivo do ciclo básico é instituir um tipo de formação superior que é uma extensão do ensino médio, visando tornar o indivíduo apto a concluir sua formação nas empresas, estilo universidade corporativa, ou então a prestar um novo vestibular dentro da universidade para ficar mais dois anos, estudando as matérias específicas de um campo do conhecimento.
O texto não obriga, diretamente, a instituição a ministrar este tipo de formação. Entretanto, o faz de forma indireta, pois este tipo de formação será considerado positivamente na avaliação das instituições de educação superior. Deste modo, além de
O Anteprojeto fere a autonomia da Universidade, obrigando-a, por meio do processo avaliativo, a ministrar este tipo de formação. É importante ressaltar que o financiamento das universidades estará vinculado à nota obtida no processo avaliativo e ao PDI.
Esse sistema fere a autonomia da Universidade, constituindo-se numa forma de controlar e punir as instituições de ensino superior, além de adotar critérios que favorecem claramente as instituições privadas. Um exemplo disto é que um dos fatores avaliados é a capacidade de captar recursos da instituição, o que obriga as instituições públicas a buscarem recursos no mercado - é o que o documento chama “capacidade de gerar recursos”.
O art. 7º nos capults 2º e 3º legalizam a comercialização internacional do ensino superior, pois abre a possibilidade de instituições privadas validarem diplomas de pós-graduação emitidos por instituições estrangeiras.
A autonomia universitária é fortemente atacada, de diversas maneiras. No art. 13, o Anteprojeto ignora uma bandeira histórica do movimento, que é a definição jurídica do conceito de Autarquia Especial, exposto no art.207 da Constituição e que identifica a forma jurídica da Universidade Federal. Esta indefinição é proposital, pois exime a responsabilidade do Estado e flexibiliza a integração com o setor privado.
Ainda no art. 13 o anteprojeto abre precedente a mercantilização internacional do ensino superior de duas formas:
a) Permite que para as instituições de ensino com finalidades lucrativas que até 30% do capital seja estrangeiro (atualmente o capital estrangeiro não pode ter participação nenhuma)
b) Esta segunda forma é mais grave, como cerca de 90% das instituições de ensino superior não se registram com finalidade lucrativa, e sim como associações, beneficentes ou comunitárias, estas poderão ter um capital de até 100% estrangeiro. Pois pelo princípio do direito, o setor privado pode fazer tudo que não é proibido, e o Anteprojeto não proíbe a participação do capital estrangeiro nas instituições que não se reconheçam com finalidades lucrativas. É a privatização nos moldes da OMC.

O art. 14 apresenta um elemento de possível regulação do setor privado, que já foi rechaçado pela associação de classe dos empresários de educação, um dos motivos que levou o MEC a produzir novas modificações no anteprojeto para divulgar uma 4ª versão, pois determina que nas instâncias deliberativas tenha majoritariedade da participação da comunidade (mesmo sem definir o que é comunidade) e do poder público.
A integração entre público e privado sobre o pretexto da regulamentação continua, pois ainda neste artigo, permite o financiamento público para atividades de pesquisa e extensão para as empresas de educação que se registrem como comunitárias e tenham uma boa nota no ranking do MEC.
Um outro retrocesso frente as lutas históricas do movimento estudantil, é no que se refere a participação nas instâncias de decisão: mantêm a majoritariedade dos professores, em detrimento da universalidade defendida, e atropelando até a paridade já conquistada em diversos cursos e universidades federais por todo o Brasil. Vai de encontro até a deliberação do último congresso nacional da ANDES, que defende a paridade. Ver art. 17 e art. 31. Outro retrocesso do Anteprojeto é a expansão do mandado do Reitor de quatro para cinco anos.
O art. 18 apresenta os requisitos para uma instituição se classificar como universidade que foram se reduzindo entre a primeira e terceira versão do anteprojeto, reduzindo a quantidade mínima de cursos e a titulação dos professores. Mais a frente no art 55º amplia os prazos para que tais exigências sejam cumpridas. Mais uma vitória do setor privado junto ao Governo. Além disso, inserem o caráter tecnicista e de centros de excelência (parágrafo único do art. 17), onde a tendência é copiar o modelo norte-americano, onde poucas instituições públicas são reconhecidas como excelentes na região, concentrando o já escasso financiamento público em detrimento do conjunto do sistema federal.
Ao caracterizar o Centro Universitário, o anteprojeto retira a obrigatoriedade deste de exercer pesquisa, portanto desaparece o princípio básico da indissociabilidade entre ensino-pesquisa-extensão (ver art. 22). E também dá liberdade para o setor privado criar cursos e aumentar vagas, desde que proposto no Plano de Desenvolvimento Institucional.
O Plano de Desenvolvimento Institucional é um termo de compromisso entre a Universidade e o MEC, onde deve constar as diretrizes do desenvolvimento de cada instituição de ensino. O problema é que este plano precisa ser aprovado pelo MEC (ingerência, perda de autonomia). Além disso, este PDI legitima as fundações de direito privado, pois deve constar o plano de trabalho destas fundações, inclusive indicando que tais fundações devem auxiliar a instituição na gestão e captação de recursos, principalmente quando envolver a expansão e qualificação. È a operacionalização jurídica da proposta de Bresser para as organizações públicas não-estatais gerirem o ensino superior, desresponsabilizando o Estado de acordo com os princípios do modelo neoliberal.
O sistema estadual e municipal de ensino público superior é praticamente esquecido no anteprojeto, basicamente a participação do MEC neste nível de ensino se resume a possíveis protocolos de cooperação visando apenas a expansão deste setor. Deixa como possibilidade, e não como obrigação.
O descaso do governo federal com as universidades estaduais não pode ser deixado de lado sob o argumento de que isto é responsabilidade de cada estado. Estas foram prejudicadas, pois o Governo Federal mudou a vinculação de parte dos recursos que repassa a cada Estado para financiarem a educação, obrigando os estados a investirem no ensino fundamental e limitando o investimento no ensino superior. Isto explica, em parte, as crises cada vez maiores das Estaduais nos últimos cinco anos. Segue citação na íntegra da justificativa da PEC 217:
“Já nos Estados, o crescimento das matrículas na educação superior foi mais espetacular – 109.252 em 1980, 194.417 em 1990, 332.104 em 2000 e 415.569 em 2002 – e a situação financeira ficou mais grave. As universidades e instituições estaduais são financiadas por parte de seus impostos (FPE, ICMS, IPVA e ITCM) vinculados à MDE. Acontece que, pela Emenda Constitucional 14/96, 60% dos 25% dos impostos vinculados segundo o art. 212 da Constituição Federal (ou seja, 15% do total) passaram obrigatoriamente a financiar o ensino fundamental e compor o Fundef, restando os outros 40% dos 25% (ou seja, 10% do total) para custear o ensino médio e o superior.”
A integração público-privado apresenta-se claramente no art. 29, onde na definição do sistema federal de ensino estão incluso o setor público e privado. Isto é extremamente importante, pois ao longo de todo o anteprojeto, toda vez que lermos “sistema federal de ensino”, está inserido o setor privado. Inclusive nos artigos que falam sobre financiamento. Este tópico será desenvolvido mais a frente.
A gratuidade nas universidades públicas, é garantida apenas para o ensino (ver art. 42), não se garante gratuidade da pesquisa e extensão nas universidades públicas federais, regulamentando a prática de cursos pagos que já existe e privatiza a universidade por dentro.
Enfim chegamos a um dos pontos cruciais, o financiamento. Tal elemento merece reduzida atenção por parte do Anteprojeto, constando apenas de três artigos. De imediato, é necessário deixar bem claro, que não garante mais recursos para o ensino público.
A legislação atual determina que 18% da receita de 5 impostos sejam aplicados em educação. Todavia, existe um mecanismo chamado desvinculação das receitas da união (D.R.U.), que retira 20% das receitas que deveriam ir para a educação e usa o dinheiro para compor o superávit primário. A única alteração que o anteprojeto propõe, é vincular 75% do já minguado orçamento para o ensino superior. Mas isto também é só regulamentar o que já está em prática e se demonstra insuficiente, pois desde a década de 1990 este é aproximadamente a porcentagem que o MEC vincula ao ensino superior (ver PEC 217).
A situação é tão gravemente neoliberal que apenas a manutenção do que já existe significa progressivamente menos recursos para o ensino, não apenas devido a DRU, mas a quantidade de recursos que estes cinco impostos vinculados à educação vem arrecadando, a cada ano se reduz.
Outro grave problema, é que não garante que os recursos públicos sejam destinados para a educação pública. Isto está muito claro no anteprojeto, quando diz no art. 49 “A União aplicará, anualmente, nas instituições federais do ensino superior...”. Lembrando o artigo 29, que define enquanto sistema federal de ensino superior o setor público e privado, logo as instituições do sistema federal de ensino também são as “empresas de educação”.
Isto legitima uma prática já corrente do MEC, que são programas que destinam financiamento com recursos públicos para o ensino privado, a exemplo do FIES, já analisado anteriormente neste documento. Este artigo também se articula com diversos outros presentes no Anteprojeto, que permitem que as empresas de educação concorram a editais públicos de instituições como o CAPES e CNPQ (o que também já vem ocorrendo, ainda que timidamente em poucos editais).
Uma bandeira histórica parece estar presente no Anteprojeto, que é retirar custos com aposentados, hospitais universitários e outras rubricas dos custos do ensino superior, o que representaria um aumento significativo de verbas. Todavia os outros ministérios envolvidos, em especial o ministério da fazenda, já informaram que não irão retirar estes custos da educação. Isto ficou especialmente claro no final do ano 2005, quando o MEC propôs enviar a terceira versão do anteprojeto para votação no congresso. Antes disso Lula enviou o texto para os diversos ministérios, que reunidos informaram que o projeto estava “muito caro” (ou seja, gastando muito com educação, por incrível que pareça!!!), que o ministério da saúde não iria arcar com os custos do hospital universitário, nem o da previdência com o custo dos aposentados. O MEC ficou de reformular o anteprojeto nestes pontos.
Para completar, vincula uma extração anual da loteria para o financiamento da educação (ver art. 57), ou seja, agudiza a desresponsabilização do Estado com a Educação. Em tudo, prevalece a lógica hegemônica neoliberal do governo Lula, ainda mais que quem financia a loteria é a esmagadora população de baixa renda do Brasil. Os pobres que irão arcar com estes custos, não a minoria abastada.
Quanto a Assistência Estudantil, o anteprojeto estabelece uma lógica extremamente perversa, pois ao invés de ampliar as verbas para a Assistência Estudantil, determina que 9% do orçamento da instituição deverá ser destinado à assistência, ou seja, não aumenta o volume global nem garante os recursos necessários, apenas rateia o já minguado orçamento público. Além disso, inclui como despesas de Assistência Estudantil bolsas de pesquisa e atividades de extensão.
Assim, apesar de aparentemente num primeiro momento o valor global da assistência estudantil em cada universidade tender a aumentar, inclui despesas que não são de assistência (bolsas de pesquisa e custos de extensão), além de não realizar um aumento real do gasto com educação, mas repartir o pouco de cada universidade.
Por fim, o Anteprojeto determina que 40% das vagas do ensino superior sejam em instituições públicas. Mais uma letra morta da lei. Não garante os recursos, não determina prazos, e a estratégia principal para atingir esta meta é o ensino a distância.

04 – PROPOSTAS DA SOCIEDADE CIVIL E DO MOVIMENTO DOCENTE PARA A UNIVERSIDADE BRASILEIRA


Apresentamos a seguir dois documentos que foram elaborados por amplos setores da sociedade brasileira, que defendem que o Ensino Superior Público, Gratuito, de Qualidade e Socialmente Compromissado: Proposta da ANDES e o Plano Nacional de Educação. Em diversos momentos estes textos nos forneceram subsídios para a compreensão diferenciada do ensino superior brasileiro.


04.1 - Proposta da Andes-SN - Uma Proposta do Movimento Docente para o Ensino Superior Brasileiro

A Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior – Sindicato Nacional vem refletindo desde 1987 sobre o que é Universidade, e historicamente vem lutando por uma Universidade de qualidade. Portanto, sua proposta é um documento denso, rico em referências bibliográficas e constitucionais. Além disso, o documento recupera todo o processo histórico sobre cada aspecto da Reforma Universitária, o que demonstra que estamos em um processo cheio de idas e vindas, onde o que é apresentado como novo na realidade é re-edição de medidas que no passado foram rejeitadas.
Frisa constantemente sua posição em favor da universidade pública, gratuita e democrática. E há também uma forte ênfase no descaso cada vez maior do Estado para com a educação. Por ser uma análise ampla, aborda cada medida do Estado para privatizar o ensino público, enfatizando constantemente os aspectos acima. Constitui-se em uma excelente base para reflexão, apresentando argumentos técnicos, históricos, e uma comparação entre a proposta atual e medidas anteriores que eram condenadas pelo Governo.
A proposta da Andes para Reforma Universitária traz elementos muito interessantes, entre os quais destacam-se:
• Padrão Unitário de Qualidade: estabelece linhas gerais, metas a serem alcançadas para que o ensino no Brasil seja de qualidade, mas dando margem às diferenças regionais por todo o país. Engloba também as IES Privadas, que se não alcançarem este padrão devem fechar. Estabelece uma política de transição, para que as IES privadas realmente sejam “obrigadas” a chegar até lá;
• Sobre a caracterização jurídica diz que na Constituição de 1988 as Universidades são caracterizadas sob o regime de Autarquia Especial, todavia não está definido este conceito. Propõe uma definição de Autarquia Especial (todavia muito vaga, sendo necessária uma melhor definição), principalmente em relação à captação de recursos no mercado e em relação com a Lei de Inovação Tecnológica e as Parcerias Público-Privadas;
• Para o financiamento argumenta que devem ser investidos 10% do PIB ao ano para todos os níveis de educação, até que se atinja as condições desejáveis, havendo então uma redução do investimento para 7%. Defende também que 12% do orçamento da União seja direcionado para a Universidade Pública; e um investimento emergencial de 1,2% do PIB para a pesquisa, até que se redimensione e discuta o modelo atual;
• Estabelece diretrizes para a definição autônoma da comunidade universitária quanto às políticas acadêmicas de ciência e tecnologia;
• A autonomia em relação ao governo se dá, de forma geral, pela definição do conjunto das universidades públicas de como investir o dinheiro público, ao contrário do modelo atual, onde as universidades enviam planos institucionais que são negociados com o governo;
• Aborda também a questão da capacitação docente, elaborando um plano nacional;
• Define que a gestão democrática significa participação em todas as instâncias de decisão por todos os membros da comunidade acadêmica (professores, estudantes, funcionários), além da representação da sociedade civil. Todavia não define como se dará esta participação, em porcentagem de votos para cada, nem em quais aspectos a comunidade interna e/ou externa terão mais poder;
• A gestão democrática se dá pela transparência e prestação de contas periódicas a toda sociedade brasileira;
• Propõe também um modelo de avaliação em contraposição ao SINAES, ou seja, são favoráveis a avaliação em outros moldes e com outras finalidades. É extremamente diferente da proposta do Governo, pois serão as próprias universidades tomando a diretrizes de como se avaliar, mas de um modo a evitar os corporativismos;
• Em anexo, traz uma proposta para a Educação Técnica e Tecnológica (cursos técnicos em geral).

A proposta da Andes traz aspectos bastante positivos a serem considerados na reforma do ensino superior brasileiro. Aspectos estes, que o governo, por opção política, prefere ignorar ao tentar aprovar uma proposta que considera as imposições do sistema capitalista e dos organismos internacionais, em detrimento das reais necessidades da sociedade brasileira.


04.2 - Plano Nacional de Educação da Sociedade Civil – Uma Proposta Construída por Entidades Representativas da Sociedade Civil Organizada

O Plano Nacional de Educação (PNE) elaborado por entidades representativas da sociedade organizada e entregue ao Congresso Nacional em 1998, parte de um diagnóstico do sistema educacional brasileiro, tendo como tese que este se encontra imerso em uma crise que vem se agravando devido à política neoliberal adotada pelos governos brasileiros nos últimos anos.
O Plano apresenta dados comparativos entre a realidade no Brasil e em outros países, dados estes que evidenciam a grave crise enfrentada pelo sistema educacional brasileiro, e destaca que esta crise tem suas raízes no descumprimento de preceitos fundamentais contidos na Constituição Federal de 1988, mostrando artigo por artigo como estes preceitos são feridos. Além disso, o documento critica diversas medidas que vêm sendo baixadas nos últimos anos, e que são consideradas no PNE como um retrocesso para o sistema educacional brasileiro.
O PNE apresenta propostas para a organização da educação nacional, analisando diversos níveis de ensino, desde a educação infantil até o ensino superior. Aborda a educação especial e a profissional, a erradicação do analfabetismo, e a formação dos profissionais de educação, entre outras temáticas; tecendo diversas criticas às políticas públicas governamentais e explicitando um conjunto de diretrizes e metas para dez anos de atuação na área educacional.
O Plano defende a educação pública, gratuita e de qualidade e prega também o principio da gestão democrática na educação, que garanta a autonomia das instituições educacionais.

O PNE da Sociedade Civil traça uma clara política de financiamento para a educação, estabelecendo prioridades para os próximos dez anos que visam recuperar o atraso educacional no Brasil. Entre outras medidas, o plano propõe:
• Aumento, em dez anos, dos gastos públicos com educação até cerca de 10% do PIB, sendo possível uma redução posterior;
• Suprimento da defasagem de verbas para a educação e incrementação de novas fontes de recursos para o setor;
• Combate ao Fundo de Estabilização Fiscal (FEF), que foi substituído pela DRU, enquanto medida econômica que retira os recursos para a educação.

O PNE da Sociedade Civil define a Universidade como um elemento constitutivo do processo de construção da identidade social. Defende a Educação Superior realizada através do ensino, da pesquisa e da extensão de forma indissociável, cabendo ao Estado a responsabilidade de assegurar o acesso a esse direito social a todos os cidadãos.
O Plano traça diretrizes e metas para a Educação Superior, entre as quais destacam-se:
• Destinação de recursos não inferiores a 1,2% do PIB, até atingir 2,7% do PIB em dez anos, para financiar ensino, pesquisa e extensão nas Universidades e Instituições de Ensino Superior públicas;
• Garantia de reais condições de desenvolvimento acadêmico ao estudante universitário, através de recursos e mecanismos que assegurem condições de alimentação, transporte, moradia e disponibilidade de material de estudo, àqueles que delas necessitem;
• Implantação de um sistema de dotação orçamentária global, com suplementação automática de modo a compensar possíveis desvalorizações monetárias ao longo do exercício financeiro;
• Avaliação democrática da produção científica e tecnológica, tomando por base a necessária responsabilidade social e acadêmica dessa produção;
• Atendimento, num prazo dez anos, de 40% da população na faixa etária de 18 a 24 anos, inclusive aos alunos com necessidades educativas especiais;
• Ampliação, no prazo máximo de dois anos, do quadro de vagas mediante aproveitamento total da infra-estrutura existente, inclusive em horários noturnos;
• Processos de avaliação institucional periódica do ensino superior, compreendendo a avaliação interna e externa de todos os setores envolvidos e tomando como referência o projeto político-acadêmico da instituição;
• Garantia de representação paritária entre docentes, discentes e funcionários técnico-administrativos nos órgãos decisórios das instituições de nível superior;
• Criação de Conselhos Sociais, com participação da comunidade e entidades civis organizadas, para acompanhamento e controle social das atividades universitárias, com o objetivo de assegurar o retorno, à sociedade, dos resultados das pesquisas, do ensino e da extensão;
• Criação de Conselhos Gestores junto aos hospitais universitários, com representação das comunidades interna e externa, de forma a garantir acesso universal gratuito.

O Governo de Fernando Henrique Cardoso aprovou, no ano de 2001, o Plano Nacional de Educação do Governo (PNE 2001/2010). O Plano aprovado sofreu diversas modificações, em relação ao elaborado pela sociedade civil. Diversos pontos da proposta original foram alterados até se chegar ao PNE que vigora atualmente.
A proposta de vincular a verba da educação ao produto interno bruto, por exemplo, que é colocada tanto no PNE da sociedade civil, quanto na Proposta da Andes, foi alterada quando da aprovação do PNE em vigor. A vinculação de 10% do PIB, proposta pelo PNE da sociedade civil, passou para 7% no PNE 2001/2010. Além disso, muitos vetos foram impostos ao PNE pelo Governo FHC, e o principal foi exatamente ao artigo que previa a vinculação de 7% do PIB à educação.
A reforma que o Governo Lula tenta aprovar não contempla as reais necessidades da educação superior brasileira. Em lugar de buscar fontes alternativas para o financiamento da educação superior, desresponsabilizando-se por esta, o Governo deveria buscar soluções para a atual crise em propostas e alternativas já formuladas, como é o caso do PNE da sociedade civil, e no debate democrático com aqueles que vivenciam o dia-a-dia acadêmico e com a sociedade como um todo.



05 – EIXOS FUNDAMENTAIS PARA A DISCUSSÃO SOBRE O ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO


A partir deste momento, apresentamos uma análise específica sobre os eixos que consideramos fundamentais na discussão sobre Reforma Universitária:
· Financiamento
· Indissosiabilidade entre Ensino-Pesquisa-Extensão
· Acesso e Permanência
· Autonomia
Os pontos acima estão apresentados com a seguinte metodologia: leitura do discurso geral, contra-argumentação e apresentação de proposta do Grupo de Trabalho. Ressaltamos que as propostas que apresentamos são eixos que consideramos fundamentais para serem discutidos e aprofundados por toda a sociedade e o governo, não são um projeto de lei.



05.1 - Financiamento da Educação Superior Brasileira

A principal justificativa para desresponsabilização do Estado por setores estratégicos como a educação é a existência de uma crise de Estado, que é apontada como a grande responsável pela crise econômica. Segundo este discurso, o Estado não possui recursos, e por isso deve transferir parte de sua responsabilidade para o Mercado e para a sociedade civil.
De fato, o governo Lula, assim como os seus antecessores, optou por priorizar o pagamento da dívida externa, a manutenção do superávit primário de 4,25% do PIB e a aprovação da reformas estruturais – seguindo fielmente a cartilha imposta pelos organismos internacionais do capital, em especial o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional.
De acordo com dados da execução orçamentária do Governo Federal[2], o Governo Lula destinou entre os meses de janeiro e outubro de 2003 R$ 86,151 bilhões ao pagamento das dívidas interna e externa, e reservou apenas R$ 46,084 bilhões para as áreas de: segurança pública, assistência social, saúde, educação, cultura, urbanismo, habitação, saneamento, gestão ambiental, ciência e tecnologia, agricultura, organização agrária, energia e transportes.
Estes dados evidenciam que a falta de recursos para investir em setores de fundamental importância para a sociedade, e a transferência destes para o setor privado, nada mais é do que uma opção política - e não uma crise de recursos, como propagado pelo Governo.
Para a área da educação, a pauta do Governo tem sido a mesma dos organismos internacionais: investimento mínimo; abertura do sistema educacional, em especial a educação superior, para o capital privado, através das chamadas parcerias; e diversificação das fontes de financiamento.
O Plano Nacional de Educação, aprovado no ano de 2001, previa a destinação de 7% do PIB para a educação. Entretanto, este a artigo foi vetado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. O atual presidente manteve o veto e vem implementando uma política que aprofunda a lógica de privatização adotada no governo anterior.
De acordo com o artigo 212 da CF 88, a União deve vincular para a educação, nunca menos, de 18% da receita de alguns impostos federais, depois de retirado o repasse legal para os Estados e Municípios. Sendo que nunca menos de 75% desta receita, de acordo com o Anteprojeto da reforma universitária, deve ser aplicado nas instituições federais de ensino superior.
No entanto, boa parte dessa receita não chega efetivamente ao orçamento do MEC. Parte da verba que deveria ser destinada à educação é desvinculada do orçamento pela DRU (já mencionada anteriormente), que garante ao Governo Federal a possibilidade de retirar 20% da verba para ser gasta em alguma outra área.
A DRU foi instituída no ano de 1993, no Governo de Itamar Franco, com o nome de Fundo Social de Emergência (FSE). O FSE foi substituído pelo Fundo de Estabilização Fiscal (FEF), que vigorou até 1999. Com o término da vigência do FEF, instituiu-se a DRU, que foi regulamentada pelo Governo Lula no contexto da Reforma Tributária – dando continuidade ao perverso contingenciamento das verbas da educação, e por conseqüência ao sucateamento do ensino superior brasileiro.
De acordo com o documento do campo Contraponto sobre Reforma Universitária, em 2003 o montante dos impostos arrecadados chegou perto de 113 bilhões de reais. Deste montante deve ser retirado o repasse para os Estados e Municípios (40% do orçamento total), além de ser retirado também o orçamento geral pelo Executivo através da DRU (20% do orçamento total). Sobraram então, cerca de 44 bilhões, e é sobre este montante que se calcula os 18% destinados à educação. Parte desse recurso é destinada para a complementação do Fundef (agora Fundeb), que em 2003 foi o equivalente a 620 milhões, sobrando cerca de 7,38 bilhões. Segundo o que está previsto no Anteprojeto da reforma universitária, 75% destes 7,38 bilhões é que devem ser vinculados para o ensino superior.
O Governo Lula, assim como o seu antecessor, vem descumprido o dispositivo que prevê a complementação federal devida ao Fundef (Fundo de Manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental), que é um dos principais responsáveis pela dívida da União. A complementação não realizada nos dois primeiros anos do Governo Lula totalizou um montante de cerca de R$ 6 bilhões.
O Fundef, que foi instituído pela Emenda Constitucional nº 17, de 1996, e recentemente transformado em Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), passando a financiar a educação infantil, o ensino fundamental e o médio. Mas será que a instituição do Fundeb, sem uma mudança drástica nas fontes e na forma de financiamento da educação brasileira, é realmente viável?
É importante ressaltar que a base de cálculo da receita destinada para a educação considera apenas recursos advindos de impostos (II, IE, IR, IOF e IPI). No entanto, nos últimos anos a arrecadação de taxas e contribuições vem crescendo muito mais do que a dos impostos, e o Governo Lula vem dando continuidade a criação ou elevação das taxas e das contribuições em detrimento dos valores dos impostos, cuja receita vem sendo reduzida pela isenção fiscal concedida pelo governo (no Prouni, por exemplo), e também pela sonegação e a elisão fiscal. Outro aspecto que chama a atenção, nessa base de cálculo, é que os impostos vinculados não taxam o setor que realmente acumula riquezas, não taxam o setor especulativo nacional.
Vale ressaltar também que os gastos com serviços nos hospitais universitários são contabilizados do orçamento da educação, quando deveriam ser considerados como despesas da saúde. Além disso, também a folha de pagamento dos inativos é descontada da receita da educação (a desvinculação da folha está prevista no Anteprojeto). Segundo o professor Otaviano Helene (2004), subtraindo todas essas incorreções, o Brasil tem gastado apenas 0,6% do PIB com a educação superior. De acordo com o professor “Essa questão da falta de recursos é um nó para o desenvolvimento do Ensino Superior no Brasil; não é possível criar um sistema sólido de ensino superior com tão poucos recursos”.
O Estado não tem dinheiro para financiar as instituições públicas de ensino superior, que sofrem cada vez mais com a falta de verbas, que incentiva a captação de recursos no mercado pelos cursos que despertam maior interesse dentro da lógica capitalista, e a degradação daqueles cursos que não se inserem dentro desta lógica. Mas, este mesmo Estado oferece benefícios às instituições privadas, que retiram preciosos recursos do setor público.
Dados apresentados pelo Deputado Petista Ivan Valente e o professor Otaviano Helene mostram que a renúncia tributária em favor das IES privadas alcançou cerca de R$ 870 milhões no ano de 2003; somada à renúncia previdenciária, de R$ 462 milhões; aos débitos previdenciários, de R$ 184 milhões, e aos gastos do Sistema de Financiamento Estudantil (Fies), de cerca de R$ 900 milhões, chegam à cifra de R$ 2,4 bilhões. Já no custeio do ensino superior público, o Governo investiu apenas R$ 695 milhões.
Estes dados evidenciam que o Governo, com o mentiroso discurso de que o ensino superior privado é mais barato, prefere investir na expansão deste e incentivar as instituições públicas a buscarem fontes alternativas de financiamento.
A tão propagada “falta de verbas” para financiar o sistema educacional brasileiro, em especial a educação superior, nada mais é do que opção política de um Governo que fere a lei máxima brasileira ao desvincular o montante previsto constitucionalmente para a educação, e opta por financiar a educação privada e incentivar a mercantilização do ensino superior público.
A educação é um direito constitucional, e por mais que se diga que a prioridade deve ser o ensino fundamental e o médio, para que o Brasil supere o atraso educacional no qual se encontra, é preciso investir em todos os níveis de ensino. Afinal é a Universidade que forma os docentes, que atuam desde a educação infantil até o ensino superior. É preciso investir no ensino básico, pois é aí que está o alicerce de todo o processo educacional. E é preciso investir na expansão da educação superior pública, gratuita e de qualidade, não apenas como um adestramento de profissionais para o mercado capitalista, mas como um processo de formação que segundo a professora Marilena Chauí é o “o núcleo fundamental do trabalho universitário”.
É urgente uma drástica mudança nas fontes e na forma de financiamento da educação brasileira. Diante disto propomos algumas diretrizes para o financiamento do sistema educacional brasileiro, em especial a educação superior:

• Aumento progressivo a verba destinada à educação, até que se alcance o percentual de 10% do PIB havendo uma redução posterior até 7% do PIB, sendo 3% do montante destinados ao Ensino Superior Público, ou, 20% do pagamento anual da dívida externa destinados ao financiamento da educação.

a) Reformulação dos impostos vinculados à educação, pois os impostos atualmente vinculados não vêm do setor que acumula riquezas e não taxam o setor especulativo;
b) Inclusão de taxas e contribuições, que se constituem em outras formas de arrecadação de recursos públicos;
c) Extinção imediata da Desvinculação das Receitas da União (DRU), enquanto medida que contingencia recursos do sistema educacional;
d) Correção e suplementação automática ao longo do exercício para desvalorização;
e) Redução progressiva, 20% ao ano, dos gastos com as IES privadas em todas as formas de apoio direto ou indireto a estas instituições: Faz universitário, crédito educativo, FIES, linhas de financiamento de bancos e órgãos públicos – sendo estes recursos revertidos para o ensino público;
f) Custeamento dos Hospitais Universitários pelo sistema único de saúde (sus)
g) Custeamento da Folha de pagamento dos aposentados e inativos pelo sistema
previdenciário, com garantia de paridade, e sem taxação de 11% ou quaisquer outras
formas de precarização.



05.2 - A Indissociabilidade entre Ensino, Pesquisa e Extensão

Uma das bases do sistema de educação superior brasileira é a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão prevista no artigo 207 Constituição Federal de 1988, que pressupõe que “As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”.
Para melhor entendermos este principio, e se ele é realmente seguido nas Instituições de Educação Superior (IES), é necessário uma análise sobre um primeiro conceito: o de indissociabilidade.
Apesar desta palavra não constar em alguns dos principais dicionários da língua portuguesa, a idéia de indissociável está ligada a algo inseparável, que deve ser implementado sempre em conjunto, um complementando a função do outro.
Entretanto, não são necessárias grandes verificações para percebermos que este preceito constitucional é desrespeitado por uma parcela considerável das instituições de ensino superior brasileiras. Isso ocorre, por um lado, pela falta de compromisso de muitas instituições com o desenvolvimento sócio-cultural e econômico do país, tomando a educação como mero produto gerador de lucro (no caso de parte das instituições particulares, que optam por oferecer apenas o ensino, que é mais “barato” e “industrializável”) e, por outro lado, especialmente nas Universidades Públicas, pela falta de investimentos que propiciem o desenvolvimento destas atividades. Isso sem contar a burocracia (ligada à falta de autonomia) e a falta de integração entre os diversos setores administrativos e pedagógicos.
Os sucessivos decretos que regulamentam a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), são um exemplo claro da ruptura entre ensino, pesquisa e extensão, cada vez mais latente na educação superior brasileira. No decreto 3.860, de 09 de julho de 2001, por exemplo, a questão da indissociabilidade desapareceu da legislação educacional. O artigo 8º do referido decreto prevê que “as universidades caracterizam-se pela oferta regular de atividades de ensino, de pesquisa e de extensão...”. O termo “indissociabilidade”, presente na Constituição, e em decretos anteriores, desaparece no decreto 3.860.
Analisando a legislação que sucedeu a LDB (1996), é possível constatar também que esta prevê somente para as instituições caracterizadas como Universidades, a obrigatoriedade no desenvolvimento de atividades de pesquisa e extensão. Quanto às outras instituições (centros universitários, faculdades, etc), não consta esta obrigatoriedade.
No Anteprojeto da Reforma Universitária, já analisado anteriormente, que classifica as instituições de educação superior em universidades, centros universitários e faculdades, mais uma vez observa-se que a obrigatoriedade em desenvolver atividades de pesquisa e extensão, somente é mencionada para as instituições classificadas como universidades, tratadas na seção III, na qual é reafirmado o princípio da indissociabilidade previsto na CF 88 (art 14, III).
As IES públicas possuem maior tradição enquanto universidades de ensino, pesquisa e extensão, mas, as privadas devem oferecer e aumentar esse tipo de apoio à sociedade (Campos, 1996). E este apoio deve ser visto não como uma estratégia de marketing, mas como função inerente à própria instituição de ensino.
Para o desenvolvimento desta análise sobre o tripé que se constitui na base da educação superior, serão recuperadas a seguir características básicas de ensino, pesquisa e extensão apresentados por Alberto Mesquita Filho (1997):
Quanto ao ensino, o autor coloca que este se daria em três fases: A colocação do tema curricular; os estudos e/ou debates; e a síntese. O primeiro diz respeito ao currículo que cada curso direciona o aluno a seguir. Após a análise das características da Pesquisa e da Extensão, ficará evidente um caráter mais “restritivo” do Ensino, no sentido de haver a necessidade em se seguir um currículo básico pré-estabelecido. E essa restrição envolve tanto professores (limitados naquilo que devem ensinar) quanto alunos (limitados naquilo que ele devem aprender). Segundo Mesquita Filho: “Podemos até questionar o grau de exigência a que o professor está submetido, porém, queiramos ou não queiramos, algum tipo de currículo deve ser obedecido. Não teria cabimento, numa faculdade de medicina, o professor ensinar seus alunos a construir um viaduto...”.
Apesar desta aparente limitação curricular, cabe a um projeto pedagógico bem elaborado, evitar que isso se transforme em limitações na capacidade crítica dos alunos.
A segunda fase (estudos e/ou debates) corresponderia ao processo de transmissão e incentivo a busca de conhecimentos, em que o aluno deve ser estimulado a pensar e a pesquisar, e não apenas a copiar aquilo que o professor afirma. E a terceira (síntese), como a próprio nome diz, o aluno sintetiza aquilo que ele viu e transforma em conhecimento próprio.
As três fases que representam a Pesquisa, segundo este autor, seriam: A aquisição de conhecimentos visando à criatividade; a elaboração de novos conhecimentos; e sua difusão.
Já a extensão seria resultante dos contatos com os problemas da comunidade; estudos em busca da solução; e resolução do problema (aqui se subentende resolução do problema como suprimento de possíveis necessidades sociais, culturais e econômicas).
Nota-se aí que para a implementação de programas de extensão, é necessária uma relação mútua entre instituição e comunidade, com amplos benefícios para ambas às partes.
Oberdan Dias da Silva (1997) traz um resumo esclarecedor sobre como se dá essa indissociabilidade: A universidade é detentora do conhecimento e o transmite, por meio do ensino, aos educandos. Por meio da pesquisa aprimora os conhecimentos existentes e produz novos conhecimentos. Pelo ensino, conduz esses aprimoramentos e os novos conhecimentos aos educandos. Por meio da extensão, pode proceder a difusão, socialização e democratização do conhecimento existente, bem como das novas descobertas, à comunidade. A extensão também propicia à complementação da formação dos universitários, dada nas atividades de ensino, com a aplicação prática, de maneira que as três atividades tornam-se complementares e dependentes, atuando de forma sistêmica.
O ensino precisa da pesquisa para oxigená-lo, aprimorá-lo e inová-lo, pois, do contrário, corre o risco da estagnação. O ensino necessita da extensão para levar seus conhecimentos à comunidade e complementá-lo com aplicações práticas. A extensão precisa dos conteúdos, educandos e professores para ser efetivada. A extensão necessita da pesquisa para diagnosticar e oferecer solução aos problemas diversos com os quais irá deparar-se, bem como para que esta esteja constantemente atualizando-se. Por sua vez, a pesquisa prescinde dos conhecimentos detidos pelo ensino, como base de partida para novas descobertas. Além disso, a pesquisa depende do ensino e da extensão para difundir e aplicar sua produção, e assim, indicar-lhe os novos rumos a seguir.
Após esta explanação, podemos concluir que ensino, pesquisa e extensão são indissociáveis a partir do momento que se busca o desenvolvimento, o aprimoramento, a democratização e a troca de conhecimentos entre o meio acadêmico, científico e a comunidade, sendo esta união estratégica para o desenvolvimento de qualquer país.
Apesar de no Brasil a importância da indissociabilidade entre estas três atividades já ser reconhecida e bastante discutida, faltam meios (econômicos, administrativos e pedagógicos) para que esta união se dê de maneira satisfatória.
O objetivo maior das universidades deve ser aliar o ensino com produção científica, favorecendo a extensão de seus conhecimentos e serviços à comunidade (Campos, 1997). E o não oferecimento desse trinômio, implica em inconstitucionalidade por omissão (Ranieri, 1997).

05.2.1 - Ensino

A visão organizacional imposta à Universidade trouxe conseqüências nefastas para o tripé que sustenta a educação superior: ensino, pesquisa e extensão. A Universidade tornou-se operacional, regida por contratos de gestão e definida por padrões alheios ao conhecimento e à formação intelectual (CHAUÍ, 2004).
Nos últimos anos o ensino tornou-se uma mercadoria extremamente rentável. Essa mercantilização não só rompeu com a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, prevista constitucionalmente, como também ocasionou um processo massificação do ensino superior. As instituições privadas oferecem, em sua grande maioria, apenas os cursos mais visados pelo mercado capitalista, e transformaram-se numa grande fábrica de diplomas.
Diante desta visão organizacional da educação superior, ainda segundo Chauí (2004), a docência é entendida como a rápida transmissão de conhecimentos consignados em manais de fácil leitura. O estudante não é mais incentivado a pensar, ou questionar. O ensino superior é, em muitos casos, a pura e simples transmissão e reprodução do conhecimento. Os currículos são voltados para uma formação pragmática e rápida, pois o mercado, cada vez mais competitivo, necessita da “mão-de-obra” egressa das instituições de ensino superior, que dentro de pouco tempo estará ultrapassada, em decorrência das constantes mudanças que ocorrem no mundo globalizado.
É preciso recuperar o ensino superior brasileiro! E essa recuperação deve passar por uma ampliação no número de vagas nas Universidades públicas, que apesar de estarem sendo fortemente atingidas pela mercantilização da educação superior, ainda preservam as atividades de pesquisa e extensão, que aliadas ao ensino constituem a base da formação superior e a essência da Universidade. E também por uma transformação curricular, pois é de suma importância que estudantes de todas as áreas do conhecimento tenham uma formação que lhes possibilite uma consciência crítica que os torne capazes de compreender e intervir nos processos sociais.
Nos últimos anos, os governos têm priorizado a expansão da educação superior, via estatização das instituições privadas (por meio do financiamento estudantil - Fies, e da compra de vagas públicas em instituições privadas - Prouni), e também fortalecimento da educação superior à distância (EAD).
O documento elaborado pelo Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), em outubro de 2003, afirma que a expansão da educação superior pública dar-se-á por meio do aumento da carga didática dos docentes, do aumento do número de estudantes por turma e, principalmente da educação à distância. Em lugar de propor um aumento do número de vagas na Universidade pública pela total utilização de sua infra-estrutura, que é em muitos casos sub-utilizada; pela contratação de um maior número de docentes; e pela obrigatoriedade, por parte das IFES, de oferecer, para todos os cursos, aulas em todos os turnos – obrigatoriedade esta já prevista na LDB (1996). O documento do GTI propõe que os docentes passem mais tempo nas salas de aula, tendo, por conseqüência, menos tempo para dedicar-se às atividades de pesquisa e extensão; propõe também um aumento no número de estudantes por turma, que além de ser uma situação pouco confortável, compromete o aprendizado, pois reduz o tempo para o debate e o questionamento em sala de aula. E por fim, o documento propõe a expansão da oferta de vagas através da educação superior à distância, seguindo mais uma das recomendações do Banco Mundial.
A educação à distância vem se tornando uma realidade cada vez mais presente no ensino superior brasileiro. A LDB (1996), menciona, no artigo 80, que o poder público irá incentivar o ensino à distância em todos os níveis e modalidades de educação. No documento elaborado pelo GTI, é estabelecida uma meta de 500 mil estudantes à distância até 2007.
Segundo Boaventura de Souza Santos (2004), “a universidade é uma entidade com forte componente territorial bem evidente no conceito de campus. Essa territorialidade, combinada com o regime de estudos, torna muito intensa a co-presença e a comunicação presencial...”. Ainda segundo o mesmo autor “Com a conversão das novas tecnologias em instrumentos pedagógicos, a territorialidade é posta a serviço da extraterritorialidade e a exigência da co-presença está a sofrer a concorrência da exigência de estar on line”.
De fato, a ampliação de vagas via educação é distância, é a ampliação do ensino massificado, que descaracteriza a docência, e a territorialidade, e, portanto, o cerne da Universidade. Uma questão ainda não definida, segundo Boaventura de Souza Santos (2004), é, quais seriam as conseqüências dessa transformação para a pesquisa, a extensão e o ensino universitário? E também, que impacto terá essa transformação nos lugares onde as novas tecnologias ainda não são facilmente acessíveis?
A educação superior vem sendo encarada, em muitos casos, como a aquisição de competências imediatamente comercializáveis. O ensino, diante desta lógica, é considerado como uma mercadoria rentável. E neste cenário a educação superior brasileira vem perdendo sua essência. A formação está dando lugar à aquisição de competências, e uma das formas de recuperar esta essência, é recuperar e preservar a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

05.2.2 - Pesquisa

O desenvolvimento de programas de incentivo e financiamento a pesquisa é primordial para o futuro de qualquer país. Entretanto, durante o processo de “pesquisar”, tanto financiadores quanto pesquisadores esbarram num dilema: O que tem relevância sócio-cultural e/ou econômica suficiente para ser trabalhado, analisado e pesquisado?
Nota-se aí um dos grandes problemas no estabelecimento de prioridades a serem estudadas, já que os conceitos de relevância social, cultural e econômica variam de pessoa a pessoa. Por isso existe a necessidade de um amplo debate entre os diversos segmentos da sociedade para definir o que é prioridade dentro do desenvolvimento brasileiro.
Outro grande desafio é aliar desenvolvimento social e cultural com desenvolvimento econômico. Conceitos que muitas vezes aparecem como antagônicos, deveriam, na verdade, andar juntos.
No Brasil percebe-se que há uma intenção do Governo Federal, e de seus órgãos responsáveis por “regular” a pesquisa no país, de unir essa atividade às necessidades da iniciativa privada, colocando o desenvolvimento econômico num degrau acima do desenvolvimento social e cultural. O que é um grande erro, pois estes deveriam andar no mesmo patamar, já que além de desenvolver o país economicamente, é importante distribuir esse dinheiro de forma mais igualitária e mostrar à população como gastá-lo da melhor maneira possível.
Essa intenção pôde ser verificada, recentemente, na Lei de Incentivo à Inovação Tecnológica, sancionada em 02 de dezembro de 2004, no contexto da reforma da educação superior brasileira. A referida lei, já analisada anteriormente, incentiva a pesquisa voltada para o processo produtivo, em detrimento do desenvolvimento social e cultural.
A partir da análise do orçamento dos principais fomentadores de pesquisa no país (CNPq e Capes), pode-se perceber um outro grave problema. Existe uma grande concentração de recursos financeiros (financiamento) e humanos (pesquisadores) em algumas poucas regiões do país (especialmente na Região Sudeste). E pior, muitos dos potenciais pesquisadores e cientistas, além de outros já em atividade se deslocam para as regiões com maior concentração de recursos, pois não encontram estímulo suficiente para atuar em suas regiões de origem.
Por exemplo, o CNPq, segundo sua própria Resenha Estatística, investiu no ano de 2003, em bolsas e no fomento a pesquisa, aproximadamente, 331 milhões de reais na região Sudeste, contra, aproximadamente, 71 milhões na região Nordeste, 100 milhões no Sul, 37 milhões no Centro-Oeste e 17 milhões na região Norte. Somente os estados de São Paulo e do Rio de Janeiro participam com quase 50% do valor investido.
Entre 1976 e 2004, o número de cursos recomendados pela CAPES saltou de 673 para 2.993, o que representa um aumento de 5,6% ao ano. Destaca-se o crescimento do doutorado, que praticamente duplicou no período de 1996 a 2004. O segmento público é responsável por 82% da oferta dos cursos de mestrado e por 90% dos cursos de doutorado. Apesar do crescimento apontado, persiste uma distribuição desigual entre as regiões do Brasil, uma vez que a região Sudeste concentra 54,9% dos cursos de mestrado e 66,6% dos de doutorado, seguidos da região Sul (19,6% e 17,1%), Nordeste (15,6% e 10,3%), Centro-Oeste (6,4% e 4,1%) e Norte (3,5% e 1,8%).
Dentro de seu orçamento total (aproximadamente R$ 544 milhões), a CAPES utilizou R$ 422 milhões com bolsas no Brasil e no exterior. No caso das bolsas concedidas no exterior, das 1499 oferecidas, 750 ficaram na região Sudeste, 296 no Sul, 171 no Nordeste, 55 no Centro-Oeste e apenas 19 na região Norte. Já nas bolsas cedidas no próprio país, a região Sudeste concentra 59% dos investimentos, contra 23% da região Sul, 13% do Nordeste, 4% do Centro-Oeste e 1% da região Norte.
Cabe, portanto, a revisão dessas concentrações, que só agravam as diferenças de desenvolvimento entre as regiões brasileiras.
Segundo Mesquita Filho (1997), “a ciência não tem fronteiras, e o cientista pode optar por sua área de estudo, conquanto seja mais fácil que se restrinja à sua área de atuação”. O mesmo autor coloca ainda a importância fundamental da intuição, do insight, que viriam posteriormente a uma fase de aquisição de conhecimentos.
No Anteprojeto de reforma universitária, está previsto, em seu artigo 35º, inciso VI, que as Universidades Federais seguirão, dentre outros princípios: “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte, a cultura e o saber”. Entretanto, com o sentido cada vez mais produtivista da pesquisa desenvolvida no Brasil (que é incentivado pela Lei de Inovação Tecnológica), nossos cientistas não estão mais tendo a liberdade de optar por investir seu tempo, e seus conhecimentos, naquilo consideram relevante para o desenvolvimento do seu país. Pelo contrário, eles estão tendo de seguir as linhas de pesquisa que possuem maior possibilidade de se conseguir investimentos, pois, de outro modo, não podem atuar no ramo cientifico. Estamos vivendo numa sociedade com produção industrial, em larga escala, e a pesquisa vem seguindo o mesmo caminho.
Logicamente, pesquisas que incrementem o setor produtivo são de importância crucial para a economia de um país. Mas, o que não pode ocorrer é que esse objetivo venha a ser alcançado através da subordinação dos interesses públicos diante da iniciativa privada.
Um aspecto que não pode ser esquecido ao se falar em pesquisa científica é a importância da iniciação científica na graduação. O grande desafio da Universidade é formar indivíduos capazes de buscar conhecimentos e utilizá-los. O conhecimento não é algo acabado e o estudante deve ser estimulado a buscar, produzir e aprimorar o conhecimento. Sendo assim, é de extrema importância a valorização da iniciação científica na graduação. É preciso ampliá-la como uma atividade curricular, devidamente orientada e avaliada, para possibilitar uma melhor formação do estudante na Universidade.
Cabe ainda uma sugestão de incluir nas premissas que caracterizam as Universidades (art. 13º), os Centros Universitários (art. 25º) e as Faculdades (art. 27º), a presença de grupos de pesquisa consolidados (o número de grupos, número mínimo de integrantes, e outros aspectos desse tipo devem ser discutidos). Grupos estes que gozem da autonomia necessária para desenvolver suas pesquisas, e nos quais seja incentivada e valorizada a pesquisa de relevância social.


05.2.3 - Extensão

Dentro do trinômio Ensino, Pesquisa e Extensão, esta última é, por certo, a menos debatida, mas, não por isso a menos importante. Isso se deve, em grande parte, a um problema conceitual, tanto pela enorme quantidade de conceitos já criados, quanto pela dificuldade em se criar um conceito verdadeiramente abrangente.
A extensão pode ser vista como cursos oferecidos pela instituição; como uma forma de prestação de serviço; como complemento das funções da Universidade; ou mesmo como “remédio” ou forma de amenizar alguns dos problemas da sociedade (Filho, 1997). Dentro de todas essas visões, existe um ponto em comum: A extensão é um veículo de integração entre a Universidade e a sociedade em geral, de socialização e troca de conhecimentos.
O Plano Nacional de Extensão Universitária traz um conceito interessante acerca do tema: “A Extensão Universitária é o processo educativo, cultural e científico que articula o Ensino e a Pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação transformadora entre Universidade e Sociedade.” O documento diz ainda que “A Extensão é uma via de mão-dupla, com trânsito assegurado à comunidade acadêmica, que encontrará, na sociedade, a oportunidade de elaboração da práxis de um conhecimento acadêmico. No retorno à Universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que, submetido à reflexão teórica, será acrescido àquele conhecimento.”
E ainda, segundo a Pró-Reitoria de Extensão da UFBA: “Para a graduação, a extensão constitui um espaço pedagógico da maior relevância na formação dos estudantes e na revitalização dos conteúdos e práticas curriculares. Para a pesquisa, a extensão potencializa a análise de diferentes objetos e enseja a experimentação de novas metodologias, além do salutar diálogo entre os saberes de dentro e de fora da academia”.
A partir da análise dos trechos acima, percebe-se que a extensão tem papel crucial para toda e qualquer instituição que queira estabelecer uma boa relação com a comunidade no seu entorno. “E essa interação constante com a sociedade, (...) permite que a Universidade não se encastele, que não se torne uma instituição corporativa, voltada apenas para seus membros, e que defenda apenas os interesses dos seus membros. A interação com a sociedade traz todo dado de realidade que é necessário para que a universidade tenha ressonância dentro do meio social em que ela está...” (Ranieri, 1997).
As atividades de extensão permitem ainda, segundo Oberdan Dias da Silva (1997), o conhecimento da realidade da sociedade na qual a instituição está inserida; a possibilidade de diagnosticar necessidades de pesquisa e outras ações, prestação de serviços e assistência à comunidade; fornecimento de subsídios para o aprimoramento curricular e criação de novos cursos; fornecimento de subsídios para o aprimoramento da estrutura e diretrizes da própria universidade em busca da qualidade; e trocas de conhecimentos e experiências entre comunidade e Universidade.
O que falta para a implementação da extensão como atividade inerente é a criação de planos e políticas eficientes de valorização desta atividade dentro das Instituições de Ensino Superior, tanto públicas quanto privadas.
É praticamente um consenso entre as pessoas que lidam diretamente com essa atividade, que ela não deve sofrer a regulação através de uma lei federal, pois isso tiraria a criatividade e a autonomia das instituições de criar as maneiras mais apropriadas, dentro de características regionais, de interagir com a comunidade a sua volta.
As diretrizes da política de extensão devem ser criadas a partir de medidas como o Plano Nacional de Extensão, que foi criado no I Encontro Nacional de Pró-Reitores de Extensão, a partir de debates e trocas de idéias de quem lida com o assunto diariamente.O Plano Nacional de Extensão sugere, entre outras coisas, a criação de um fundo que sirva para financiar, exclusivamente, esse tipo de atividades.
Cabe aos órgãos competentes, implementar meios, especialmente financeiros, no caso das Universidades Públicas; e a exigência do cumprimento do artigo 207 da Constituição Federal (que fala sobre a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão) por parte das instituições particulares. Cada instituição deve criar um plano específico dentro da área de extensão e esses planos e seus resultados práticos devem ser apresentados, periodicamente, à sociedade.
Cabe então algumas sugestões referentes às políticas de extensão. O Anteprojeto poderia trazer, claramente, o que caracteriza as atividades de extensão, já que estas são apresentadas de diversas maneiras, ora como cursos, ora como articulação entre ensino, pesquisa e extensão, dentre outras. Isso acaba refletindo a já citada confusão conceitual e a abrangência que envolve o tema.
A presença de políticas de extensão não deve ser exigida somente nas características das Universidades e Centros Universitários, mas também das Faculdades, servindo esta exigência para todas as IES, tanto públicas como privadas.


Após esta análise sobre ensino, pesquisa e extensão, propomos as seguintes diretrizes para estas atividades:
• Utilização de toda a estrutura física, (das Universidades Federais de um modo especial) nos três turnos, ampliando o número de vagas, mas respeitando um limite máximo de alunos por turma, e contratando um maior número de docentes efetivos que possam dedicar-se não apenas à transmissão do conhecimento em sala de aula, mas também às atividades de pesquisa e extensão, orientando e avaliando os estudantes;
• Obrigatoriedade, em todos os cursos, da inserção de disciplinas voltadas para uma formação mais humana e que facilite a compreensão dos processos sociais, como por exemplo, materialismo histórico, filosofia, economia e política;
• Estabelecer um plano estratégico de formação de professores e administradores públicos em todas as áreas do conhecimento;
• Utilização do ensino à distância apenas como um recurso complementar (no sentido de eletivo). Não devendo ser conferido diploma de graduação por meio, exclusivo, do ensino à distância;
• Recuperação da iniciação científica e das bolsas monitoria na graduação. E inclusão da formação de grupos de pesquisa consolidados e do desenvolvimento de atividades de extensão como premissas para a caracterização de uma instituição como universidade, centro universitário ou faculdade, quer seja pública, quer seja privada;
• Promoção, através de convênios, da participação de outros ministérios no incentivo às atividades de pesquisa;
• Definição de linhas de extensão e pesquisa nas seguintes áreas: políticas públicas, integração com os demais níveis de ensino e superação do viés mercadológico na formação superior:
a) Estas atividades devem ter caráter curricular obrigatório, devendo o estudante participar de pelo menos uma das áreas;
b) No mínimo 30% dos docentes de cada curso deve desenvolver uma das atividades mencionadas acima, de modo a intervir em uma determinada área.



05.3 - Acesso e Permanência no Ensino Superior Brasileiro

Nos últimos anos, tem se falado muito no Brasil sobre a democratização do acesso ao ensino superior. No entanto, fatores de discriminação, principalmente de classe social, raça e região continuam a fazer do acesso à Universidade uma mistura de mérito e privilégio.
O sistema de ensino brasileiro reflete a enorme desigualdade de um país que tem um dos piores índices de distribuição de renda do mundo. O acesso à Universidade, principalmente às Universidades públicas (que concentram o melhor ensino, - apesar do sucateamento ocorrido nos últimos anos - além de oferecerem pesquisa e extensão) é hoje um privilégio da classe mais abastada, o que evidencia que as diferenças sociais estão fortemente arraigadas na educação brasileira.
Os estudantes das classes menos favorecidas deixam o ensino médio totalmente despreparados para ingressar na Universidade. Isso, por causa da péssima qualidade dos ensinos básico e médio, públicos, no Brasil. As escolas sofrem com a carência de equipamentos, assistência e uma boa infra-estrutura, e com professores desmotivados, muitas vezes despreparados.
No outro extremo estão os estudantes dos segmentos mais favorecidos da sociedade, que têm acesso a um ensino de qualidade bastante superior, apesar de ser comum atualmente, em muitas escolas privadas, que o estudante em todo o ensino médio seja apenas “adestrado” para obter êxito no vestibular. Além disso, esses estudantes possuem fácil acesso a livros e materiais, além de complementos educacionais como cursos de línguas, cursos de artes, atividades esportivas, atendimentos psicológicos e viagens culturais.
Ao lado da desigualdade econômica, está a desigualdade racial. Em muitos estados brasileiros, a camada mais pobre da população é composta por afro-descendentes, e, também, por indígenas. Apesar da importância do sistema de cotas para o processo de democratização no acesso à Universidade, este é apenas a “ponta do iceberg”, que ameniza, mas não resolve o problema do acesso ao ensino superior.
Aliado ao sistema de cotas, é necessário que o Estado, através de uma mudança radical no financiamento, que acarretará no aumento dos recursos disponíveis, invista fortemente na recuperação do ensino público brasileiro, desde o ensino básico até o superior. É preciso recuperar o “atraso educacional” no Brasil.
As políticas educacionais adotadas nas últimas décadas acarretaram, segundo Boaventura de Souza Santos (2004), numa “desqualificação da Universidade como locus de formação docente”. A nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB, 1996) estabelece que todos os docentes da educação básica deverão ter formação superior. Entretanto, com o sucateamento da Universidade pública, ocorrido nos últimos anos, ocorreu uma progressiva privatização da formação e capacitação dos professores do ensino básico. Ainda segundo Santos (2004), a capacitação destes profissionais “tornou-se um dos segmentos mais prósperos do emergente mercado educacional, testemunhado pela proliferação de instituições privadas que oferecem cursos de capacitação de professores para as redes de ensino”.
O Estado deve comprometer-se com a recuperação do ensino público, em todos os seus níveis. É necessário também que se estabeleça um compromisso entre a Universidade e a escola pública, para que, a partir daí, possam ser estabelecidos mecanismos institucionais de colaboração, e construída uma parceria entre os sistemas públicos de ensino, de modo que exista uma integração entre a formação profissional e a prática do ensino.
O acesso ao ensino superior só será realmente democrático, quando os estudantes, ricos ou pobres, brancos, índios ou negros, puderem pleitear uma vaga na Universidade em condição de igualdade com os seus concorrentes. E essa igualdade só será possível quando os estudantes do ensino público tiverem professores capacitados e motivados, bibliotecas, equipamentos e toda a infra-estrutura necessária para uma formação de qualidade.
Outro aspecto de fundamental importância no que diz respeito ao acesso à Universidade é a avaliação do ensino médio e o exame do vestibular. A meritocracia, enquanto o acesso ao ensino superior não puder ser universal, deve ser requisito para o acesso à Universidade, combinado com o uso de ações afirmativas que garantam o acesso de populações excluídas dos processos educacionais. Entretanto, o estudante deve ser avaliado de forma gradual durante os três anos do ensino médio, através do exame de avaliação do ensino. E, por fim deve prestar o vestibular, que fica sob responsabilidade da instituição de ensino superior.
Com o investimento na recuperação do ensino, o estudante, seja ele oriundo da rede pública ou particular, poderá ser avaliado de forma equânime, e então ingressar na Universidade podendo optar pela área do conhecimento que mais desperta o seu interesse, e não buscar o curso de “acesso mais fácil”.
Ao se falar em democracia no acesso ao ensino superior, é importante abordar também a problemática da assistência estudantil. A educação superior deve ser gratuita, e aos estudantes carentes deve ser garantida toda a assistência necessária à sua permanência na educação superior. Cabe ao Estado garantir assistência médica gratuita e de qualidade para os estudantes, e residência universitária, para aqueles que precisam deixar seus lares para freqüentar a Universidade. É dever do Estado garantir também, alimentação subsidiada nos restaurantes universitários, pois com essa garantia, o estudante poderá passar mais tempo na Universidade e dedicar-se às atividades acadêmicas - como pesquisa, extensão, e tudo mais que pode servir de crescimento e aprendizado para um estudante universitário.
O Estado deve conceder, também, bolsas de manutenção para estudantes carentes. Estas bolsas devem ser concedidas mediante contrapartida de trabalho nas atividades de extensão e em atividades acadêmicas no campus ou fora dele. E o estudante que gozar deste benefício, deve obter um bom desempenho curricular. Estes estudantes devem exercer atividades relacionadas à área do conhecimento na qual irão se formar, atividades estas que poderão constituir-se também em uma forma de retribuir à sociedade a oportunidade que lhes é concedida.
O acesso à educação pública, gratuita e de qualidade é um direito de todo cidadão, e sendo assim, é dever do Estado garanti-lo de forma democrática. Para isto, propomos:
• Caber à Universidade autônoma a definição dos critérios de acesso dos estudantes, de modo que seja garantida a universalidade e a escolha de mecanismos igualitários e democráticos. No acesso por meio do vestibular, garantidas as especificidades de cada instituição, parte da nota deverá levar em consideração o ENEM. Sendo que este último deverá ser realizado de forma processual, durante os três anos do ensino médio;
• Garantia de 50% das vagas nas instituições públicas de ensino superior reservadas para estudantes oriundos de escolas públicas (que tenham cursado todo o ensino médio nesta rede). Essas cotas devem levar em consideração o percentual de auto-declarados negros, pardos ou indígenas – de acordo com último censo realizado pelo IBGE. Este percentual deve decrescer, de modo que seja suspenso em 10 anos. Paralelamente à implantação do sistema deve haver um aumento do número de vagas (nas condições já mencionadas), de modo que a entrada do estudante oriundo da rede pública na Universidade pública não se seja uma forma de excluir os demais estudantes (oriundos da rede privada), e também um investimento na melhoria do ensino básico, de modo que em dez anos este possa atingir um padrão de qualidade que capacite um estudante oriundo de escola pública a concorrer, em situação de igualdade, com o do ensino privado. Sendo que ambos, tanto o ensino público, quanto o privado, não devem limitar-se a uma mera preparação para o vestibular;
• Garantia de assistência médica para os estudantes das instituições públicas de ensino superior;
• Garantia de alimentação subsidiada nos restaurantes universitários, que devem oferecer refeições para, no mínimo, 50% dos estudantes;
• Garantia de residência universitária em boas condições, e com a manutenção da devida assistência, para todos os estudantes que dela necessitarem;
• Garantia de creche universitária para todos os estudantes que dela necessitarem;
• Bolsa auxílio, não inferior a um salário mínimo, para estudantes carentes, que devem retribuir com atividades de extensão, e outras atividades acadêmicas, além de rendimento acadêmico satisfatório enquanto forem beneficiados pela bolsa, sob pena de perdê-la.
• Passe livre para os estudantes de todos os níveis de ensino. Ressaltamos que essa pauta é mais que simples assistência, é um direito baseado na Constituição Federal (art. 208, VII) e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/1996, arts. 10, VII e 11, VI). A LDB prevê que Estados e Municípios arquem com as despesas de seus respectivos alunos, mas não faz nenhuma referência ao governo federal. Nossa reivindicação é que essa obrigação se estenda também à União e, mais que isso, que a Lei e a Constituição sejam efetivamente cumpridas, de forma a garantir o pleno direito à educação (que começa pelo direito de ir à escola, faculdade, etc.)



05.4 - Autonomia Universitária

A indefinição dos papéis e funções do Estado e do modelo de desenvolvimento que irá se firmar no capitalismo nos próximos anos são os reais fatores a serem considerados na discussão sobre as diversas reformas que vêm ocorrendo no Governo Lula. O momento gelatinoso pelo qual o Estado e os movimentos sociais passam atualmente é uma das conseqüências do estabelecimento do modelo neoliberal.
Discutir autonomia universitária é abordar um ponto sensível da sociedade brasileira: ao transmitir para a população em geral a imagem (errônea) de uma Instituição onde a maioria dos participantes tem um conhecimento acurado e por isso podem decidir suas questões sozinhos, acaba-se ignorando o que é realmente fundamental: o projeto de nação que deve ser o lastro da Universidade Pública, e é sobre este projeto que devemos discutir.
A autonomia universitária brasileira começa por uma indefinição da CF 88: a definição jurídica é de autarquia especial, todavia este tópico não é desenvolvido posteriormente. Ao partir para uma revisão histórica da Universidade brasileira, podemos partir da releitura apresentada pela ANDES em sua proposta para o Ensino Superior, é possível perceber que a indefinição da autarquia especial gera inúmeros problemas e dubiedade no real papel da Universidade. Essa dubiedade está presa fundamentalmente nas diversas formas e possibilidades de relacionamento com o setor privado e com o MEC.

• Primeiro é preciso discutir a indefinição dos papéis e funções do Estado como um dos elementos fundamentais do modelo neoliberal, pois a Universidade Pública está inserida numa sociedade e fundamentalmente ligada ao Estado, saber para onde o Estado e sociedade se dirigem é saber para onde a Universidade está sendo conduzida.
• A capacidade reativa da Universidade a esta condução é a real medida de sua autonomia, que é primariamente gerada pela participação dos estudantes, professores, funcionários e apoio da sociedade nos fóruns institucionais (ou não) de discussão.

A proposta apresentada pelo MEC para Reforma Universitária vem de um Estado submisso à ideologia neoliberal, numa sociedade onde os movimentos sociais lutam por bandeiras diversas (numa dispersão que reduz a capacidade reativa/propositiva).
“A Universidade deve ser autônoma, mas o Estado é Soberano” - este é um dos elementos do discurso do MEC. Todavia quem realmente é soberano é o povo, o Estado detêm o poder coercitivo geral, esta diferença entre Soberania e Poder Coercitivo é fundamental para compreendermos a discussão sobre autonomia universitária.
Esta autonomia perpassa por uma questão de fundo pouco explorada: a quem serve o conhecimento produzido pela Universidade? A autonomia da Universidade está direcionada ao beneficiário deste conhecimento, isto é um fato inexorável. A luta que está sendo travada é para que o Saber não tenda para apenas um dos pólos da sociedade (que no momento é o pólo mais rico e poderoso - os empresários), mas que a direção do conhecimento seja para os excluídos e prejudicados pelo sistema vigente enquanto buscamos repensar nosso modo de produção.
A autonomia sempre esteve presa aos diversos conflitos de classe. A comunidade interna da Universidade sempre esteve dividida, pois produziam conhecimento para as diversas classes. A crise atual da Universidade é que há uma nítida supremacia do modelo neoliberal, que privilegia uma pequena parcela da população.
Diante da atual crise da Universidade, e, partindo do pressuposto de que a Universidade é autônoma e quem é realmente soberano é o povo, propomos:

• Definir Autarquia Especial (juridicamente);
• Definir a relação entre o setor privado e a Universidade;
• Acabar, em um prazo de cinco anos, com os convênios entre as IES públicas e as fundações de direito privado;
• Rompimento com CNPq e Capes;
• O Comitê de decisão da Universidade deve composto um número de representantes que deve ser bem maior do atual CONSEPE:
a) Este Comitê deverá ser composto por representantes dos estudantes, professores e funcionários, além do reitor da instituição. Sendo que o poder de voto deve ser igual para todos os participantes;
b) Este Comitê deverá elaborar o PDI da instituição, juntamente com um planejamento estratégico, a cada quatro anos, todavia o PDI deve ser avaliado pelo conjunto das Universidades Federais com participação do MEC e das diversas representações institucionais que compõe a comunidade acadêmica, fugindo do dirigismo atual que o Anteprojeto demonstra.

• O órgão maior de decisão, Comitê Máximo (inclusive na decisão sobre a distribuição de recursos), deve ser composto por um coletivo nacional com representantes de estudantes, professores, funcionários, reitores, governo e sociedade civil (sendo os membros da sociedade civil escolhidos pelos membros da comunidade universitária):
a) Este órgão deve estabelecer uma política de desprivatização
b) Estabelecer políticas didático-pedagógicas, curriculares e de pesquisa
c) Direcionar os recursos das instituições
d) Substituir as funções do CNPq e Capes
e) Gerir o sistema de avaliação


06 - CONCLUSÃO


Perceber a problemática neoliberal na Reforma do Ensino Superior Brasileiro é uma faceta relativamente pequena ao se considerar a totalidade do que ocorre em nosso momento histórico. O avanço do setor privado sobre a esfera pública e as formas de reação do movimento social expressam crises estruturais e históricas, tanto do capitalismo quanto dos grupos ditos contra-hegemônicos.
Ao partir para uma análise mais detalhada do modo de produção capitalista, podemos constatar que as crises cíclicas dos níveis de produção, consumo e riqueza são uma característica fundamental para a compreensão do processo histórico, econômico e social. Esta constatação partiu de expoentes com enfoques completamente distintos, podemos exemplificar com Kondratieff e Marx, pois ambos constataram isso.
A conjuntura atual é de queda cíclica do modo de produção capitalista, todos os indicadores econômicos nacionais e internacionais indicam este movimento ao longo dos últimos vinte anos, sendo que a resposta dos capitalistas é o modelo neoliberal. Para sair da crise (segundo o receituário do FMI e BM) é essencial criar novos mercados, transformar novos objetos/elementos/culturas em mercadorias de alto valor.
Se nas crises anteriores do capitalismo a solução foram guerras mundiais, imperialismo, colonialismo, etc, a solução atual buscada pelo empresariado é a diluição das fronteiras entre público e privado, a primazia da lógica mercantil sobre a lógica pública, comunitária ou cooperativista, este é o resultado desta necessidade de interromper a queda cíclica.
Após traçar este cenário, percebemos que existem três grandes razões que levam os capitalistas neoliberais a submeter o Estado para que este privatize a educação:
A primeira é a necessidade de novos mercados para superar a crise cíclica, sendo que isto não ocorre apenas sobre a educação, é preciso privatizar as empresas estatais, criar políticas públicas que dêem subsídios as grandes empresas, realizar a Reforma da Administração Pública de Bresser, e diminuir drasticamente a participação do Estado na ordenação da vida social.
Uma segunda razão, é que estamos na Sociedade Informacional, onde as novas tecnologias de informação e as estratégias empresariais estão pautadas sobre a conquista hegemônica do Conhecimento. É necessário para o modelo neoliberal que as Universidades, instituições do Saber por excelência, sejam mais do que novos mercados para produzir lucros. Mas o Saber precisa se submeter à lógica mercantil para ser o sustentáculo do novo modelo de desenvolvimento que o capitalismo vem tentando criar, pautado nas novas tecnologias.
Uma terceira razão que leva o modelo neoliberal a mercantilização da educação é a hegemonia das alternativas políticas e a busca do encerramento das lutas sociais para alterar o modo de produção capitalista, o tão desejado “Fim da História”, a busca da hegemonia total do capitalismo. A Universidade Pública é a instituição que atualmente carrega as maiores responsabilidades sobre os processos de formação individual, contribui significativamente para sedimentação dos valores na sociedade, pois forma a classe “ilustrada”, e, portanto respeitada pela maioria da população. Estas características e diversas outras tornam a Universidade Pública um dos últimos baluartes institucionais que podem apresentar uma resistência, ou alternativa à hegemonia do modo de produção capitalista. Portanto, os neoliberais buscam dominar e instrumentalizar a Universidade, e que esta passe a servir para reprodução ampliada do capital.
A constatação apresentada acima não é nova. Diversos outros autores já situaram a Universidade como intermediária na luta de classes, onde através dos seus conflitos internos servia em parte aos ricos e em parte aos excluídos que buscam alternativas. Mas devemos lembrar que a chave do capitalismo é a sua capacidade de adaptação e assimilação.
A capacidade de adaptação é a alteração dos marcos institucionais e das frações da burguesia dominante para superar as crises cíclicas, e a assimilação é a capacidade de transformar os conhecimentos e saberes divergentes em ideologias submissas, ou então destruí-las. É este processo de assimilação que a Reforma Universitária atualmente em curso traz para a Universidade Pública Brasileira.
Todavia o leitor pode estar se perguntando: qual a razão deste texto, justo na sua conclusão: realizar esta análise buscando alcançar a totalidade de nossa sociedade? É para não perdermos de vista os fatores que levaram a redação de cada linha dos documentos aqui analisados, e também das considerações deste Grupo de Trabalho. É fundamental que o leitor, neste momento, busque reavaliar tudo o que escrevemos de acordo com estas considerações finais, desta forma será possível reconhecer o nível do problema que estamos enfrentando, e o nível de responsabilidade e de enfrentamento que os movimentos sociais que desejam uma outra Reforma Universitária e um outro Projeto de Nação têm que enfrentar nos próximos anos.
A necessidade de articulação dos movimentos sociais, dos estudantes, professores, funcionários, da parcela da sociedade que ainda é passiva e de todos os outros atores que possam contribuir para que o neoliberalismo não prevaleça na Reforma do Ensino Superior Brasileiro, deve ser a meta do movimento estudantil.
Todavia observamos dois entraves: o primeiro é a fragilização e fracionamento do movimento estudantil devido às concepções distintas sobre a importância e a necessidade dos partidos e grupos internos de cada partido, além do enfrentamento destes partidos em apoio ou negação do Governo Lula. Esperamos que este documento contribua para que o movimento estudantil como um todo possa perceber que a Reforma Universitária atualmente em curso supera em muito as dicotomias partidárias ou a validade do Governo Lula, que por isso devemos nos articular em torno de um projeto unificado.
Um segundo entrave à mobilização social, é a efetiva participação das bases nas instâncias deliberativas. Isto não ocorre apenas no movimento estudantil, mas é uma máxima no movimento social, as crises por baixos níveis de participação e a fragilidade da representação são uma das conseqüências da hegemonia do modelo neoliberal. Com este documento, esperamos fornecer alguns dos elementos necessários para a discussão qualificada com as bases do movimento estudantil, para disseminar a necessidade de mobilização em torno da Reforma Universitária.




07 - Referências Bibliográficas (Incluindo Legislação Consultada)

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[1] Revista Consultor Jurídico, 07 de janeiro de 2005

[2] Dados retirados do relatório resumido da execução orçamentária do Governo Federal, elaborado em outubro de 2003, disponíveis no site www.stn.fazenda.gov.br.



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